Publicidade on-line ainda não é publicidade

Tive um pesadelo horrível ontem. Eu estava no meio de uma praça, num local desconhecido. Pelado. De repente surgiram de algum canto duas criaturas horrendas. Elas eram esquálidas, tristes, cansadas. Fiquei apavorado. Os dois seres aproximaram-se de mim com passadas lentas, coordenadas, ensaiadas. Eu não conseguia me mexer do lugar. Afinal de contas, eu estava nu. Quando chegaram perto de mim, saquei que estava perdido. Foi então que as encarei. Uma delas piscava freneticamente, a outra torcia o nariz. Balbuciei algumas palavras educadas. Mas percebi que eram surdas e mudas. Esbocei um gesto amigável. Nenhuma reação. Uma voz então ecoou dentro de mim: “Tente clicar, tente clicar!” Levantei o cursor, digo, a mão, cliquei no “piscar frenético”. Ele cessou o movimento e barbatruc: sumiram da minha frente e despertei na minha cama, ensopado de suor.

Sonhei com banners. Meu Deus, que pesadelo!

Andei pensando bastante sobre o assunto e cheguei à conclusão que o banner, coitadinho, não tem nada a ver com o problema da publicidade na Internet. Aliás, queria ele ter algo a ver, pois o banner não é publicidade.

O problema é conceitual, não de formato.

A publicidade na Internet não é, ainda, publicidade

O primeiro motivo é a performance decrescente dos formatos existentes. Mesmo que haja alguns soluços de eficiência, quando lançamos mão de recursos técnicos mais sofisticados ou de uma idéia realmente genial (raro, raríssimo), ainda assim, o impacto do banner é pífio.

Por outro lado, e como conseqüência, as verbas têm minguado na mesma proporção. Ainda que possamos creditar este fenômeno a uma dor de barriga conjuntural, é preciso ficar sempre alerta, principalmente num meio tão novo.

Da mesma maneira, existe uma série de questionamentos que vem sendo levantada no que diz respeito à verificação de audiência, e o pau corre solto. A questão está seriamente vinculada aos formatos existentes, que prometiam falaciosamente mensurabilidade de audiência total e indiscutível. Parece que os agentes do mercado estão se convencendo, enfim, que a fórmula é cheia de sutilezas e truques, e que precisamos partir para um modo novo de avaliar audiência, a saber, um modo antigo, similar àquele usado na TV.

Mas antes de tudo, é inaceitável que, em um meio novo como a Internet, tenhamos a pretensão de achar que chegamos a um formato perfeito, definitivo e matador.

Um formato promíscuo

O formato de publicidade na Internet, vale dizer, o banner, o pop-up, o patrocínio são uma interferência promíscua com o conteúdo editorial de um site.

Posto que ninguém visita um site para ver banners, claro, a interferência de que falei acima é recíproca. O mesmo “mal” que o banner faz ao conteúdo o conteúdo faz ao banner.

Não podemos entender o formato publicitário em qualquer veículo como um “mal necessário”. Se ele é um mal, é dispensável e nocivo. Faz muito tempo que o espaço publicitário, em todos os veículos tradicionais, é entendido como parte integrante do veículo em questão. Não é um apêndice nem um mal necessário.

E quando se fala de promiscuidade, fala-se inclusive na interferência inoportuna (para não dizer suspeita) de um espaço publicitário brigando com um conteúdo que se quer, por definição, isento, íntegro e ético.

Isso sem falar da promiscuidade técnica que tolhe a liberdade editorial em termos de espaço (em Ks) para comunicar conteúdo editorial.

Um formato estéril

Os formatos-referência de publicidade na Web são reduzidos. Ninguém duvida da afirmação. E, de tão reduzidos, não são adequados para criar aquilo que a boa propaganda faz, a saber, impactar, envolver, emocionar.

Faz muito tempo que a boa propaganda soltou as amarras da fórmula primitiva de apresentação racional de um produto ou marca e seus atributos. A boa propaganda vai muito além. Nesse sentido, ela também é conteúdo. Um exemplo simples: uma revista de moda contém tanto conteúdo editorial quanto publicitário. Mas ninguém se interessaria por uma revista desse segmento que não tivesse anúncios de marcas prestigiosas. Um leitor dessas revistas se interessa e se envolve igualmente pelo conteúdo editorial e o publicitário. Os dois estão tão sintonizados com pelo público da revista que a publicidade não pode ser vista como um mal necessário. Ela é, sim, um bem indispensável não só para pagar a conta, mas principalmente para atrair, cativar e fidelizar seu público.

Tem mais: o público, as pessoas não acreditam em um veículo de comunicação que não tenha conteúdo publicitário. O conteúdo publicitário avaliza a importância do meio.

O banner equivale ao insert de uma marca em um programa de TV, por exemplo. Ou, como afirmaram, é o mesmo que uma placa de estádio. Funciona? Sim, mas a distância que o separa de um comercial de 30 segundos equivale exatamente à distância que deveremos percorrer para evoluir com um espaço realmente publicitário.

Interatividade na publicidade on-line: conversa pra boi dormir

Os formatos publicitários na Web aproveitam de maneira rasa um dos atributos mais inovadores da ferramenta, a saber, a interatividade.

Vale aqui, qualificar interatividade em quatro gerações distintas.

A interatividade de primeira geração é a “interatividade on demand”. A saber, clico, vou, clico, vejo. É o zapping. Este tipo existe em outros meios, na TV, por exemplo, e, por esse motivo, ela sequer pode ser chamada de interatividade. 99% de tudo aquilo que se faz em publicidade na Web pertence a essa categoria. Portanto, para mim, 99% da publicidade que se faz na Internet NÃO é interativa.

A segunda geração é a chamada interatividade manipulada. O usuário pode interferir na mensagem, mas o resultado é sempre esperado e “manipulado”. Um joquinho em um banner é uma interatividade manipulada porque, por mais que o usuário possa usar o banner, o resultado que ele obterá deste uso sempre foi previsto. Não há resultado inesperado. 99% de todas as peças publicitárias na Web que se utilizam de tecnologias rich media são desta natureza. 99% de tudo aquilo que chamamos de “criativo” na Internet pertence a uma interatividade manipulada.

A terceira geração de interatividade é a chamada interatividade de resultado. Ela ocorre sempre que o público puder interferir em uma mensagem e quando dessa inteferência sair um resultado desejado por aquele que interferia e não por aquele que idealizou a mensagem. Um banner que faz venda no próprio banner é interatividade de terceira geração, por exemplo. Este tipo de interatividade, infinitamente mais efetiva é extremamente difícil de realizar nos espaços publicitários de que dispomos hoje na Internet.

Finalmente existe a interatividade de imersão. Mas esta está mais para filme de ficção científica. Nem vale perder tempo com ela, por agora.

A publicidade na Internet tem que aprender com a publicidade fora da Internet

Só existe uma maneira de efetivamente resolver as três questões acima de uma tacada só. Devemos criar algo que seja completamente novo. Novo para a Internet, mas velho, muito velho para todos os outros veículos de comunicação da chamada mídia off-line.

Em todos veículos existe uma separação nítida entre espaço editorial e publicitário. Precisamos criar essa separação na Internet também. Esse é o primeiro conceito.

Em todos os veículos, o espaço publicitário é compulsório, ou seja obrigatório. Na revista, na TV, no rádio, em qualquer meio, não existe a opção de não ver a publicidade. Ela está lá, em um espaço reservado e exclusivo, e as pessoas não questionam, não reclamam, não acham ruim que a publicidade esteja lá.

Por fim, me diverti com uma afirmação que li recentemente, escrita por um prestigiado publicitário da nova economia (seja lá o que for essa coisa e se é que existe essa profissão): “Quando a propaganda é muito agressiva os usuários fogem dos sites. É só ver como funciona na televisão, todo mundo fica zapeando com o controle remoto na hora dos comerciais”.

Essa desinformação com relação ao zapping é de uma ingenuidade tocante. O zapping existe, (e abençoado seja), mas ele é efetivo para que as pessoas fujam de conteúdos ruins, não de comerciais. Se o programa é ruim, zapeia-se tanto quanto se zapeia de um comercial ruim. E se depois de zapear, o público cair em um comercial bom, ele assiste ao bom comercial como assistiria ao bom programa editorial. Até mesmo o espaço comercial de TVs via satélite, a saber, aquela tela preta, insuportável, tem alta audiência quando o programa é bom e de qualidade. Alguém lembra ainda daquela bobagem chamada “picture in picture”? Aquilo não pegou, porque o problema não é fugir do espaço comercial, mas fugir do que é ruim. O controle remoto existe faz anos e está presente em 100% de todas as TVs fabricadas hoje. No entanto, o bolo publicitário da TV mantém-se inalterado em termos de relevância.

Quando a publicidade na Web for capaz de se igualar, em termos de impacto e cobertura, à TV, quem sabe esta afirmação possa ser feita. E quando isso acontecer, com certeza a publicidade na Internet deixará de ter o formato que tem, e publicitários da nova economia ou on-line serão publicitários e ponto.

Fernand Alphen
Diretor de Criação
F/Nazca S&S

Colaboração: Loy Barjas
Vice Presidente de Operações
F/Nazca S&S

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