Quartier du temple, Berlin e Trancoso.

Estava frio em Paris esse ano, mas dias lindos, o sol te encarando de frente, aquela luz e gente, muita gente dando de ombros para as ameaças que pairam pra cá do buraco de ozônio. Muita gente, de todas as fôrmas e cores, nem aí com você. Paris é assim, um “je m´en fout” de tudo e de todos. Quem procura anonimato tem que ir para Paris. No Saint André, cruzei o John Malkovitch, nos “quais” o Belmondo e no cybercafé da Rue du Plâtre uma alemã portentosa, um vovô barbudo e o Darius Khondji. Sentei no meu cantinho para uma operação compexa. Um amigo me havia enviado uma cópia do seu passaporte. Eu precisava imprimi-la porque depois precisava dela para buscar sua passagem na TAM. Ele vinha para o Brasil mas estava no Marrocos. O vovô escrevia para os netos e não encontrava os acentos. A Frida fazia negócios no celular. Khondji, sei lá, devia estar escurecendo algum story board para deixá-los com mais cara de Darius Khondji. Ele estava de costas para mim. Comecei então a imprimir o tal passaporte, em mil pedaços. Pedi um estilete e durex. Não sou muito hábil com isso. Suava debaixo do casado. Eu estava com pressa. De repente, uma voz: “o Sr precisa de ajuda?”. Virei-me. Era Khondji, sorridente. Fiquei perplexo. Ele mesmo, o gênio da fotografia se oferecendo para montar o passaporte do meu amigo. Que constrangimento. Ele fez uma piada sobre falsificação de passaportes. Tentei explicar. Ele riu. Eu também. Falamos um pouco. Do tempo, do Euro, da Argentina. Foi só. Não disse que adorava o trabalho dele, que queria entender seus pretos cheios de contrastes, que meu amigo também era diretor de fotografia, que eu havia escrito um roteiro, salut, bonne journée e ele se foi.

Talvez um enorme estômago de aço com arabescos rococó. Ou um Dorian Gray com uma vivida e indelével cicatriz no rosto. Ou ainda “L´île mystérieuse” do Tintin, com seus cogumelos que nascem do nada. Cheguei em Berlim. 9 graus negativos, nevando. Nunca me interessei muito por essa cidade. Preconceito gaulês. Fui à Filarmonia, 3 vezes. Delirei com aqueles recortes sem simetria e com a acústica que abrigou tão bem de Sibelius a Beethoven. Certa noite, voltando no meio daquele deserto deslizante, as orelhas quase caindo – porque diabos fui esquecer minha toca – entro no que me parecia ser um bar. Fiquei na porta alguns instantes para me acostumar com o escuro e o barulho. Era uma caverna aquilo. Carpetes verdes cobrindo as paredes, Teletubs pintados nas colunas, arandelas de cristal. Tudo autenticamente kitsch. Comme il faut. E agora Fernand? O que fazer aqui, nesse clube techno? Me enfiei corredor adentro mas antes mesmo de perceber o bar ao fundo, reconheci uma luz azulada na lateral. Um computador. Um não, 10, 20, um monte. Um enorme cybercafé. Ufa. Aqui eu me entendo. Aqui é minha pátria. Pedi uma máquina ao orque de plantão e sentei. Não sei quanto tempo fiquei ali, mas custou 85 marcos. Acho que foram horas. A conexão era a coisa mais maravilhosa que já vi na vida. Entrei em um monte de lugares cheios de intros complexas. Não consegui ver nenhuma. Rápido demais aquilo. Não perdi tempo escrevendo emails. Eu queria era me arremessar cano abaixo ou acima, ver um monte de bobagem, baixar MP3 (fiz isso mas nem sei porque), ver aqueles filmes de milhões de megas, beta teste de jogos. Que delícia. E só baixando, só baixando, coisas grandes e pesadas. Nem dava tempo de olhar depois. E aquele tum tum tum era a trilha daquele download titânico.

Daí, cansei. Frio congela o pensamento e o tesão sabia? Me mandei para Trancoso quase sem escala. Choveu muito. Mas tudo bem. Depois da devida aclimatação você não tem mesmo vontade de fazer nada naquela terra. Levantar o traseiro da cadeira é um custo. Você entra naquele clima pode crer bicho e pronto. O tempo para, apesar daquelas hordas de patricias e mauricios que resolveram invadir o quadrado quando veio o asfalto. Uma pena mas são as garras inevitáveis do progresso. Grotesco. Em Arraial tem um cybercafé, então vale o esforço. Fui lá checar email, fazer aquelas coisas de banco e coisa e tal. Derretendo na chocadeira, peguei um micro que delicadamente colocaram na varanda. Menino, não te conto a experiência. Internet lá é demais. Demais de lenta. Tão demais de lenta que você nem esquenta. Fica lá, curtindo os vapores que emanam aqui e ali das mesas vizinhas, numa boa. E enquanto espera, sua mente divaga por outros sitios, baixa outras paisagens, curte outras navegações. E essas também valem a pena. Muito.

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