Desfile de pergaminhos.

Da próxima vez que você for a um desfile, tenho uma idéia bombástica. Leve um saquinho de coxinhas bem quentinhas, dessas fofonas e sente na primeira fila. A voltinha no fim da passarela vai ser bem no seu colo. Duvido, mas duvido que elas resistam aos seus encantos gordurosos.

Essa estética Auschwitz é constrangedora. Os cabides são adequados para o caimento ou sei lá mais o que, mas existe mesmo alguma graça, elegância ou sensualidade em ver essas Ann Franck desfilando?

Fiquei com dó das meninas. Tão frágeis, tão jovens, tão esqualidas, amareladas e flácidas. Tênues pergaminhos.

Confesso que tentei entender e talvez alguém me ajude a encontrar a resposta.

A primeira hipótese seria para valorizar as roupas. Tem lá sua lógica: quanto mais insignificante for a modelo, mais ausente, etérea, mais se ressalta a criação. Tipo moldura: se o quadro é bom, quanto mais discreta melhor. Se for ruim, encha lingüiça com uma moldura rococó.

Depois pensei que talvez fosse para que ninguém tente pular na passarela num louco desatino apaixonado.

E se fosse para que as potenciais compradoras não ficassem envergonhadas e de tão chocadas, sentirem-se mais confiantes de suas redondezas e sobras de tecido adiposo?

Talvez seja uma questão de estética. Minimalista: quanto menos melhor, ou expressionista: quanto mais feio melhor ou ainda surrealista: quanto mais fantasmagórico, melhor.

Saquei que talvez fosse arte engajada como os posters da revolução espanhola: mães esfomeadas segurando crianças cadavéricas.  Numas de mostrar como o mundo como ele é, duro, cru, anguloso, árido.

Talvez seja uma proposta semiótica da descontrução numa tese de contra cultura spinoziana embasada no construtivismo materialista da anti matéria quantica retratando a posição do não-homem no caos que lhe deu origem.

Não estou achando nada de realmente convincente. Lembrei-me então da Gisele, linda, graciosa, elegante, sorridente, exuberante. Não é a anorexia das outras meninas que choca. É a falta de fome, de fome de viver.

Fui a um desfile e fiquei assim. Encantando com as lindas e inspiradas criações saí de lá meio triste, meio com fome. Muita fome. De coxas e coxinhas e de cores, formas, movimento, rítmo e vida.

One thought on “Desfile de pergaminhos.

Leave a Reply to redegehspace Cancel reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *

Connect with Facebook