Marketing é Cultura?

Estimular a cultura através de programas de incentivo fiscal a empresas não é nenhuma novidade. Embora os recursos investidos por meio desses estímulos ainda sejam pequenos, há praticamente um consenso público sobre o avanço político e social que as Leis Rouanet, Mendonça, do Audiovisual e outras representam.

Rediscutir os mecanismos que regulam essas leis é um risco, claro. Mas sempre vale o debate. Não podemos aceitar aquele eterno argumento: “Melhor isso que nada”.  Aviso aos cínicos: a discussão não deve tampouco levar a um “Melhor nada que isso”.

Leis de incentivo fiscal significam que as empresas em vez de recolher impostos (IR, ICMS, ISS, IPTU), podem dirigir tais recursos para patrocinar iniciativas de natureza cultural. A troca é, portanto, fácil de entender: o dinheiro, em vez de entrar nos cofres do erário, financia produtores culturais, artistas, orquestras, etc.

Para ser incentivado o projeto “cultural” deverá, então, ser aprovado pelo organismo público responsável e também pela empresa que irá “investir” seus impostos na realização dele em troca da exposição de sua marca.

Na prática, o organismo público aprova o projeto sob critérios puramente “culturais”. Não vamos, aqui, discutir, novamente, os clássicos critérios “Políticos” de aprovação. Mais uma mania brasileira essa de dizer “Político é tudo corrupto, ignorante, safado” e, por conta desse argumento a gente fica quietinho, aceitando goela abaixo qualquer decisão. “Fazer o quê?”

No entanto, quem decide de fato é a empresa que irá determinar para onde os recursos serão canalizados. O “Público” diz “esse projeto pode ser incentivado”, e o “Privado” diz “Eu quero esse ou aquele”.

Primeiro ponto: o imposto é dinheiro público. Por que, então, é o privado que deve, nesse caso, decidir onde esse recurso será aplicado? Estranho.
Segundo ponto: o marketing decide, na empresa, onde os recursos incentivados serão aplicados. Ainda que possamos admitir que o marketing tenha condições de avaliar a importância social de um projeto cultural (é discutível, eu sei, mas isso é debate para outro debate), há, portanto, um vício perigoso no processo de aprovação dos projetos.

Na prática, as iniciativas dos produtores culturais começam antes nas empresas (financiadoras) e, depois, nos organismos públicos. No Brasil, produtor cultural é coisa rara. A maioria deles entende mais de marketing do que de cultura. Simples, portanto, concluir o que acontece depois. Muitos projetos “culturais” são montados seguindo um briefing. Sim, um briefing, com objetivos de mercado, de vendas, de share para a marca. Ou, então, o projeto presumidamente cultural vai mudando, mudando, mudando até se transformar numa feira, numa blitz, num comercial, num “publi-editorial”.

Dinheiro público é verba de marketing?

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