Para Fabíola
Foi numa manhã de chuva que Eleonora infantara uma linda flor. Rosa e branca, com minúsculas pérolas negras cercando o pistilo.
Depois de algumas horas, o céu se abriu e o calor voltou. A orquídea estava orgulhosa, ligeiramente incomodada com a responsabilidade mágica que assumira. A beleza de Eleonora era tão verdadeira e tão pura que, de todos os lados da mata, a notícia se espalhou rapidamente.
Foi uma correria para ver a apoteose da bela. Animais, pássaros, insetos e até os espíritos que habitavam a floresta precipitaram-se para reverenciar a rainha.
Não é que tamanha bajulação incomodasse Eleonora. Afinal de contas, foram muitos dias de gestação sofrida, dura, solitária, mas a bela orquídea, do alto de uma humildade teatral, devolvia as manifestações de carinho, com elogios fingidos aos obsequiosos súditos de seu êxtase colorido.
Eleonora acomodava-se confortavelmente na preocupação crescente dos visitantes. Os mais diligentes construíam-lhe abrigos, os melhores artífices coseram-lhe suntuosos estofos, afinados cantores recitaram-lhe odes exaltadas, até mesmo as bromélias rivais despejavam-lhe seus sucos, para intumescer-lhe os pés.
À medida que o tempo passava, a adoração transformava-se em rotina conformista, em lei, em dogma, em mistério.
E, como o hábito sempre vence a razão, até mesmo quando numa tarde Eleonora perdeu suas sagradas pétalas, a corte continuou a orbitar à sua volta, dispensando-lhe os mesmos esforços de proteção, cuidado e veneração.
À época de nova floração, uma tímida coroa cintilou novamente na testa de Eleonora. Na terceira primavera, uma pálida auréola ainda ornou-lhe a fronte. Na quarta, os pistilos nasceram sem pétalas.
Eleonora, em sua preguiçosa vaidade, definhava.
A floresta ainda adorava a orquídea e, num crepúsculo triste, Eleonora morreu de tanto mimo.