Se um dia você acordar e perceber que algo está faltando na sua barriga, que seu umbigo sumiu, então, ouça um pouco esta história. Talvez você entenda. Ou não.
Tudo começou quando Gabriel resolveu investigar se era verdade que um dia ele iria desaparecer. Ele já fizera muitas experiências com muitas coisas diferentes e, ainda assim, essa era uma tese inaceitável. Por exemplo: quando ele escondia um objeto, ele desaparecia mais ou menos. Ninguém mais podia vê-lo, mas, em algum lugar, ele estava. Portanto, ele não tinha desaparecido. Ou, ainda, quando sua irmã ia para a escola, ela lhe dava, enfim, algum sossego, mas, só de pensar que ela estava apenas em outro lugar, significava que ela não havia desaparecido e que iria voltar.
Isso queria dizer que desaparecer era uma palavra impossível.
Ele constatou também que a mesma coisa acontecia, quando sua mãe dizia “Gabriel, esqueça”, depois de brigar com ele. Ela queria fazer desaparecer a vergonha que ele sentia de ter quebrado um brinquedo, ou a cara amassada e vermelha que ela fazia para reprová-lo. Mas ele não esquecia, e aquele sentimento ruim não desaparecia. E até voltava de repente, quando ele menos esperava.
Nada desaparecia, nem mesmo quando sua avó morreu. Isso foi mais difícil, porque quando ele ia procurá-la, quando acordava de manhã e sentia aquela vontade de correr para seu quarto pular na sua cama, não tinha ninguém lá. A cama estava bem fria. Mas, assim mesmo, a avó ressurgia, porque ele chorava muito e falava com ela na frente do espelho do banheiro.
Um dia, contaram a Gabriel que o umbigo era uma espécie de boca. Que, quando ele estava na barriga de sua mãe, era por lá que ele comia. Isso deixou ele muito intrigado, principalmente porque aquela boca alternativa tinha um nó na ponta e porque, por causa desse nó, ele era obrigado agora a comer pela boca.
Foi, então, que aconteceu uma coisa extraordinária. Uma coisa única. Gabriel que não aceitava o desaparecimento, que não acreditava que as coisas poderiam sumir para nunca mais voltar; Gabriel, que não se conformava com aquele umbigo trancafiado, fez muita força, muita força e conseguiu fazer desaparecer aquele nó da barriga, aquela espécie de boca amarrada. E, um dia, ele acordou sem umbigo, com a barriga lisinha.
E, desse dia em diante, Gabriel começou a acreditar que as coisas, as chateações, as dores no coração, as avós podiam desaparecer.