Castelo de areia

Ele começou fazendo pequenos montes com as mãos. Era mais um reflexo do que um projeto. Ele puxava a areia e a deixava cair ao lado, displicente mas ordenadamente. É claro que uma hora, os braços não alcançavam mais nada para cavocar. Então, ele agitou as pernas, fincando o calcanhar no chão e espalhando areia. Ao mesmo tempo, ele amolegou as suas primeiras construções. Cláudio nem percebeu que seu corpo inteiro estava trabalhando, pernas, pés, braços e mãos. Mas, quando ele retornou do mar onde tinha ido se refrescar, o lugar parecia um canteiro.

Ajoelhado na praia, ele pôs-se, então, a desenhar de cabeça. Ali, onde estavam os pés, duas torres avançadas de proteção. No lugar da bunda, a fortaleza do príncipe se ergueria desafiando o inimigo; do lado esquerdo, a capela; do lado direito, a sala da guarda; no fundo, o labirinto dos impossíveis amores; mais atrás, onde ele descansara a cabeça, o tesouro sagrado. Precisaria também um grande fosso e, depois do fosso, uma estrada, não, várias estradas. Uma floresta também, daquelas mágicas com selvagens monstros com pele de casca de árvore. No meio da floresta, poderia ter um pavilhão para caçar.

Do lado de trás, onde saía aquela porta pequeneninha desfarçada na muralha, tinha também um caminho que subia um morro coberto de pedras chatas. Tinha que ir devagar, por causa dos cactos que são delatores do ancião que mora na caverna e se alimentava de carne crua. Quando o tempo está muito quente como naquele dia, é pior, já que ele bebe sangue de gente desavisada. Tem uma hora que a trilha passa debaixo de uma raiz enorme de uma árvore que parece muito velha. É lá que dá para fazer uma parada, jogar a gamela amarrada em um barbante ao longo do tronco que desce lá pra baixo e trazer de volta uma água fria, fria.

O príncipe naquele dia estava com seu cavalo branco, que se chamava Hidalgo. Ele tinha decidido que ia raptar a princesa das garras do seu pai, que tinha trancado ela, porque ela gostava do príncipe. Era por isso que tinha mesmo que atravessar o morro do velho e desafiar também os gritos das águias. Mas ele era puro de coração e tinha o amuleto bordado de fios de cobre que ele apertava no peito, debaixo da armadura que tinha sido do seu avô, o rei da Tessália. Daí, ele foi foi, foi e teve uma hora que ele até lutou contra uma cobra com cabeça de raposa e rabo de porco. Lá no alto, ele parou para ver quanto ainda faltava para chegar nos domínios do maldoso conde. Faltava muito ainda, mas Balduque era muito forte e, em alguns dias de cavalgada, ele estaria aos pés da torre do cárcere de Focaccia, sua amada.

Mas as artimanhas dos espíritos controlados pelo carniceiro da montanha eram muitas. Os danados assoviaram e Cláudio virou-se. Foi, então, que ele viu suas terras, lá longe. Foi tão horrível, que ele se ajoelhou e chorou de ver seu castelo completamente destruído, tudo: a capela, a sala da guarda, o tesouro.

E a fortaleza arrasada, com forma de bunda marcada na areia da praia.

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