Brinca como eu brinco

Era uma vez quando eu fui lá para a casa do Luisinho.

Eu nem queria ir no começo porque eu estava brincando, mas fui. Dei a mão para ele e vi que ele nem olhou para mim. O Luisinho tinha muitos brinquedos que eu não tinha. Eu sabia que ele detestava dividir comigo os tratores e os caminhões e os carros e os castelos e os postos de gasolina e as gruas e os soldados também. Daí, como sempre, primeiro ele ficou lá no canto dele e eu na porta, olhando para o chão. Mas aos poucos, eu até estava acostumado, ele ia chegando porque no fundo, no fundo, ele queria brincar comigo. Teve uma vez que a gente chorou na hora que tive que ir embora. Eu também, quando o Luisinho vem na minha casa, fico com medo dele brincar melhor com meus brinquedos do que eu. Não gosto disso, fico com vontade de tirar as coisas da mão dele. Mas é só no começo. Um dia achei que ele tinha levado a minha espada preferida. E demorou muito porque mesmo depois que encontrei ela debaixo do armário, tive muito trabalho. Ela não queria brincar comigo porque o Luisinho tinha mais jeito de cavaleiro medieval do que eu. Era a mesma coisa com a grua dele porque o Luisinho nem sabia direito fazer ela girar. Depois a gente esquece tudo e brinca juntos.

Mas daquela vez, o Luisinho estava demorando muito para me chamar. De vez em quando, eu olhava para ele e fazia um passo para chegar mais perto. Daí, ele virava de costas um pouco. Achei estranho. Perto de mim, tinha umas placas daquelas coloridas que a gente monta, sabe? Sentei no chão e devagarzinho, eu brinquei de colocar uma em cima da outra, uma em cima da outra. De qualquer jeito, sem tomar cuidado, para não cair tudo. Então caía toda hora, fazendo barulho. Mas o Luisinho nem olhava para trás. Continuei assim e achei que podia fazer uma torre bem alta. Tinha que ser com cuidado. Caiu mais umas duas vezes e depois consegui até que ela ficasse quase do meu tamanho, ajoelhado. Levantei e continuei subindo com as placas. Ficou bem grande. Mas o Luisinho nem ligou para minha brincadeira. Como tinha ainda muita placa e tinha também uns cubos e mais umas arruelas e parafusos e tiras de ferro e legos, um monte de legos, e todas as coisas que podiam servir para minha construção, fui subindo mais. Até peguei uma cadeira, para ficar mais alto ainda. Quando cheguei quase lá no teto do quarto do Luisinho, desci e fiquei de frente para minha torre muito satisfeito.

Mas como o Luisinho continuou brincando com suas figurinhas, dei o maior chute na minha torre gigante. Aí também era demais. Então, ele se virou e riu. Normalmente eu teria ficado bravo com ele, mas nem liguei e ri também. Rimos muito, muito muito.

E brincamos a tarde toda depois. E até chorei, quando tive que voltar para casa. O Luisinho é meu amigo mesmo. Mesmo quando ele brinca melhor com meus brinquedos que eu. Mesmo quando eu brinco melhor com seus brinquedos que ele.

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