O campo também estava branco, todo branco. Tão branco, tão branco, que nem dava para ver a fronteira entre o céu, a terra e as coisas todas entre eles.
Fazia muito frio naquele dia. Nem chovia, nem ventava, nem nada, mas o sol dava-se em tom de desafio. Quando ele despontou no horizonte, entre as duas árvores que se abraçam no leste, a claridade reverberou no gelo que aprisionava a casa. Uma bainha assimétrica enforcava-se ao longo do beiral, e as paredes escorregavam de luz.
Um fantasma cavalgava naquelas paragens e avistou o refúgio. Quando chegou próximo da cerca, apeou, acendeu um cachimbo e fumegou um bocado. Ele percorrera muitas léguas, mas não estava cansado. Só com um pouco de nostalgia ao avistar o naufrágio da mansão quase submersa.
Finalmente ele atravessou a porta e penetrou na casa. O espetáculo que se esculpiu diante de seus olhos encheu de lágrimas o peito do cavaleiro. Anos de abandono cristalizaram ambientes e memórias.
O fantasma percorreu o espaço, arrastando suas lembranças nos móveis, no piano que desafinara seus amores, no lustre bailarino de noites fulgurantes, nos tapetes que abafaram gozos proibidos.
E lá, na cômoda petrificada, diante da coleção de saudades, o conde penado deitou seu corpo oco. E chorou lágrimas de fantasma. Lágrimas sem calor.
Nas estepes de cristal que o sol empalidece, um lençol branco percorreu destroços frios. Tão brancos, tão brancos.