Marcas pra que mesmo?

B52 chegou do Asteróide Zig há meia hora. Ele aterrissou no quintal de um tal de Teixeira, à tarde.

Depois de chacoalhar a poeira estelar, para recarregar as baterias solares, deu um pulo no bronzeamento artificial de Teixeira, enquanto se atualizava sobre seu anfitrião no Zigpídia.

“Interessante, muito interessante, refletia B52. O tal Teixeira está à frente (lidera, idealiza) de muitas estratégias (técnicas, táticas e planos de ação) mercadológicas (que dizem respeito ao mercado de compra e venda) que envolvem (que cobrem) campanhas (temporada de guerra) publicitárias (de coisas que são publicadas) para grandes marcas (pegadas, ou referente à denominação simbólica de um produto ou serviço). Marcas? Vamos investigar.”

Mais tarde, deambulando pela casa do Teixeira, B52 pesquisou com muito afinco o que seriam essas tais marcas. Encontrou muitas e de dois tipos.

As do primeiro tipo na sua maioria provinham de vestígios humanos. Pareciam ser dejetos de matéria orgânica em decomposição: de pele, de secreções e de outros que tais que B52 armazenava cuidadosamente para análise posterior.

As do segundo tipo eram muito mais uniformes, pouco variadas e, portanto, menos interessantes. Todas identificavam aquele monte de objetos inanimados que compunham o lar de Teixeira. Elas “marcavam” tudo, embora esse tudo parecesse muito parecido e com interesse científico muito duvidoso.

E tropicando aqui, xeretando acolá, B52 acabou pisando num objeto não identificado que, por ação de causa e efeito, acionou outro que acendeu e começou a falar. B52 fascinou-se com a luz que irradiava de lá, cheia de vida, cores e sons. Demorou-se por ali, deslumbrado.

E foi nesse estado de contemplação estática que Teixeira o encontrou.

O publicitário não se acanhou e sentou-se a seu lado, cansado de tantas frentes estratégicas e campanhas memoráveis.

B52 despertou de sua letargia e, com os discos rígidos completamente lotados de tanta armazenagem, entregou-se:

– O que são marcas?
– Ora, marcas são representações simbólicas de um produto ou serviço.
– Por certo. Isso eu entendi. Mas simbolizam o que exatamente?
– Simbolizam os atributos racionais e emocionais associados aos produtos e serviços.
– Racionais como?
– Como, por exemplo, “conforto e velocidade” para um carro, “poder de absorver” para um lenço, “limpeza eficiente” para um sabão de roupas. Mas essas não são importantes. Ninguém mais liga para atributos racionais.
– Não?
– Não. Ninguém compra um carro para ir de um lugar ao outro, nem um lenço para assoar o nariz e muito menos um sabão para lavar uma roupa.
– Não?
– Não. As pessoas compram um carro para se sentirem poderosas, um lenço para dar um toque de feminilidade, um sabão para se sentir vivo.
– E por que as pessoas compram um carro, um lenço e um sabão?
– Elas não compram carros, lenços e sabões. Compram marcas.
– Marcas?
– Marcas são a virtualização arquetípica das atitudes sintomáticas das pessoas, as manifestações das personalidades por símbolos interpostos, visando relacionar e situar o homem moderno no seu ser/estar, frente à sociedade, ao outro, a seu destino incerto, blábláblá.
– Marcas?
– Sim, marcas são o fascínio da humanidade, o devir capitalista mais-bem sucedido da história moderna, blábláblá.
– E o que VOCÊ faz?
– Ora, conto tudo isso para as pessoas e elas a-do-ram!
– A-do-ram?
– Sim, compram adoidadas.
– O quê?
– Ué, as próprias.
– Compram poder, feminilidade, vida?
– Exatamente!
– Elas compram onde?
– Eu poderia dizer “nos pontos de distribuição das marcas”, mas prefiro dizer “nos pontos de contato”
– Contatos?
– Sim, nessa televisão por exemplo.
– Eu posso comprar aqui?
– Praticamente.
– E o carro, o lenço, o sabão?
– Mas quem liga pra isso, meu caro? Não importa. Você vai lá na loja, mas já comprou aqui.
– Já?
– Já. Só falta você dar o dinheiro. E não se esquecer do meu.

B52 foi-se da Terra no mesmo instante, para nunca mais voltar. Voltou para Zig porque lá tem teletransporte para todo canto, ninguém fica com nariz escorrendo e muito menos usa roupas para esconder as vergonhas.

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