Vaidade digna de insignificância eterna

Outro dia, dois improváveis macaquinhos apareceram no jardim. Fiquei observando os primos alguns instantes e corri pegar a máquina. Quando voltei, eles tinham fugido. Mas de vez em quando, eles ressurgem e fazem caretas na minha cabeça.

A nossa história é um bagunça de eventos que a memória edita. A linearidade é uma presunção da linguagem. Toda criação é uma intenção ideológica. Ela tem um propósito, ainda que inconsciente.

Os saguis serviram-me para dizer que minha casa é selvagem, que sou fino observador, para irritar o sensacionalismo ecológico ou, aqui, para fingir-me de contador.

Os índios documentam-se com rigor cerimonial. Numa selva de símbolos, eles retratam suas crenças, temores, exorcismos e proezas em rituais eternamente recriados.

Nada mudou desde da noite dos tempos: somos todos documentaristas, como se isso desse mais razões a nossa incompreensível existência.

Inventamos sem cessar, instrumentos e técnicas, que calcificam a fugacidade dos eventos que mobíliam a vida.

O registro é uma espécie de obsessão pós-moderna que a Internet finge eternizar.

Os sentidos se esgarçam e vulgarizam na velocidade da tecnologia. As mensagens se simplificam ao sabor das oportunidades. Nossa história transforma-se em uma espécie de exibicionismo documentado. Agora, toda hora, para sempre e todos.

E se os macacos fugiram antes do clique, precisamos re-encenar o evento. Rápido, rápido, de qualquer jeito. Precipitar a edição dessa forma transforma nossa história em propaganda ridícula e gozação das plateias que assistem.

Vou inventar, sem avisar, um bug esteta que vai apagar do YouTube essa pornografia inútil.

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *

Connect with Facebook