O cabo da TV a cabo

Em recente pesquisa (de tão óbvio o resultado, nem preciso citar a fonte que esqueci), em média, pouquíssimos telespectadores de TV por assinatura memorizam canais e horários. A escolha é sempre aproximativa ou aleatória. Faça você mesmo o teste. Na coluna da direita, você deverá escrever a grade do seu canal de TV aberta mais freqüentemente assistido. Na da esquerda, o mesmo para um canal pago.

Audiência máxima e máxima qualificação são como gato e cachorro. Convivem mas com muitas reservas.

A busca pela audiência é baseada no binômio “mínimo denominador de apelos e conteúdos” e “programação generalista”. Esta é a receita da mídia de massa: facilidade de compreensão (no jornalismo), estímulos a sentimentos básicos (no entretenimento) e variedade (nas revistas televisivas que mesclam notícias e diversão). A televisão aberta cria portanto uma grade de programação que aprisiona (sem conotação negativa) os públicos. E nisto reside seu segredo de perpetuação: facilidade de comercialização e formação do hábito.

Já a TV por assinatura pretende ser segmentada, por assunto ou por público (ou complicando a equação, por assunto e público). A receita é baseada em profundo conhecimento das audiências e na produção de conteúdos sob medida.

E dessa pretensão nasce seu calvário.

É da natureza humana ser generalista, interessar-se por muitos assuntos, mudar de gosto e opinião. A segmentação por conteúdo gera, intrinsecamente, um apelo irresistível à fuga.

Somos animais volúveis, influenciáveis, instáveis e flutuamos sempre num mar de dúvidas. Embora sejamos educados para a auto-definição (homem ou mulher? sensível ou racional? liberal ou reacionário? esportista ou intelectual? Fla ou Flu?), tudo não passa de um fingimento social, uma máscara. A segmentação por público é uma areia movediça.

E não precisamos de muitas análises para perceber que os canais de TV por assinatura, diante de tanta incerteza, muitas vezes recorrem às velhas receitas da TV aberta, com a competência dramaticamente comprometida pela pobreza. Quando o canal fechado resolve ser um pouquinho “aberto”, mais parece uma TV com 30 anos de atraso.

Isso sem falar na miríade de canais enlatados, sem personalidade e identidade.

Os canais por assinatura nasceram para libertar o espectador da prisão monopolizadora mas o excesso de escolha e a segmentação matemática (a toque de pesquisas inócuas) aprisionaram seu sucesso no zapping: esse assassino de construção de marca.

E eis que surge a Internet. Precisamos aprofundar ou já deu para sacar?

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