Branding ou auto-ajuda organizacional

De uns anos para cá, muitas empresas embarcaram na panacéia de qualificar sua “cultura” como base de gestão organizacional. Simplificando, é o que chamam de branding.

Se por cultura entendemos o conjunto de éticas, valores e visões de um conjunto de pessoas, definir uma “cultura organizacional” é mais um dos muitos truques   antropomorfos. Esse esforço de criar paralelos entre uma empresa e uma pessoa é um divertido passa-tempo metafórico, mas na prática, branding mais parece um exercício de auto-afirmação do que outra coisa.

O processo é sempre o mesmo: começa-se com uma longa pesquisa interna, uma espécie de divã fastidioso com os dirigentes, funcionários graduados e muitos outros  pelegos. É claro que as sessões não são propriamente conduzidas por especialistas dos meandros psicológicos dos animais humanos, portanto, as entrevistas seguem um script. As respostas são tidas, pois, como verdadeiras e sinceras. Não há tempo para observar: o jeito é perguntar.

O objetivo é ouvir os caras, anotar tudo e tentar encontrar um mínimo denominador comum. Mínimos denominadores comuns são caretas mas democráticos. Esse conjunto de idéias, atitudes, visões e ambições dão  uma boa idéia do barba papa, do frankenstein, da colcha de retalhos cultural de uma empresa.

As pessoas que trabalham em uma organização não estão lá por comungarem ideais ou visões do mundo. Elas estão lá pela grana, ora, e a grana não fede, nem cheira.

O branding pega tudo isso e apresenta para quem toca o barco, quem manda na parada. O que os manda-chuvas fazem com essa inutilidade toda, só Deus sabe, mas finge-se bem: tomando-se como base a opinião de todos, decide-se que a empresa é isso ou aquilo, tem tais valores, missões, visões e toda a pataquada clássica. Me engana que eu gosto.

Quando Deus ditou as leis, Ele foi mais pragmático: chamou o profeta à montanha e não perguntou a opinião de ninguém, tascou-lhe as tábuas.

É muito louco, porque o resultado dessas investigações todas, dessa ciência ou profecia confirma (entre aspas) ou comprova (entre aspas) a opinião do dono, entrevistado em primeira instância.

Pra não dar bandeira, o truque é florear e metaforizar, em lindas apresentações e outras pirotecnias estilísticas.

E de uma organização para outra, é um copy-paste muito lucrativo para quem faz e um enorme alívio de consciência para quem paga.

3 thoughts on “Branding ou auto-ajuda organizacional

  1. Esta estratégia é irmã daquela paranóia que transforma um case de sucesso circunstancial em algum tipo de fórmula ou ciência, para que seja instantaneamente replicável e rotulado como tendência. Além de, claro, custar muito. Ah, e tem de ser complicada também, porque se for simples, elementar, o cliente aplica ele mesmo, sem precisar da gente.
    A teoria oculta por trás de tudo que faz sucesso, mesmo que ninguém saiba o porquê, mesmo que o próprio executor não saiba exatamente o porquê, ele, o branding sabe.
    Em tempo de metodologias ágeis, excelência em gestão e toda aquela bagagem advinda das novas cartilhas de empreendedorismo, está na moda empresa com personalidade. Algumas têm até corpo.
    O que fazer com a missão, com os valores, com a personalidade de uma empresa quando seus funcionários vão embora e ficam somente as paredes? Inicia-se uma busca desesperada por pessoas exatamente iguais às de antes ou busca-se um profissional qualificado e, miraculosamente, enfia-lhe garganta abaixo tudo o que aquele texto emoldurado na recepção quer significar? Algo como uma mudança de valores, remanejamento de preconceitos e desvio de opiniões. Coisa, aliás que meu analista tenta há anos, confesso que sem muito sucesso.
    Talvez ele devesse ter feito outro curso.

  2. Concordo que visão empresarial e estratégia de marca são “top-down”. Mas acho que as entrevistas e a investigação dentro das empresas servem para traçar um retrado de onde a marca e a empresa estão hoje.

    De nada adianta, penso eu definir um ponto lá longe onde ninguém saiba como chegar.

  3. Se fóssemos analisar as coisas comparando como elas deveriam ser com o que elas acabam sendo, aposto que o mesmo autor descordaria da propaganda em si, da estrutura política do Brasil… enfim, de muitas teorias que poucos praticam da maneira correta. Mas não é por isso que podemos discordá-las radicalmente.

    É bom lembrar que o Branding não só engloba os valores e relações internas de uma empresa(EndoBranding), e sim todos valores intangíveis internos e externos, relações com seus consumidores, as diversas culturas entre as partes, promessas da marca, etc.

    Concordo em parte. Principalmente, “Não há tempo para observar: o jeito é perguntar.” A partir desse ponto, em que o consultor externo define a cultura organizacional através de perguntas e respostas, em dias, é mais fácil se acreditar em uma Mãe Dináh.

    O EndoBranding não é só a arte de definir e dizer pro dono “Sua empresa é isso”. A investigação, citada no artigo, deve ser só um começo e se deve ter a certeza(mostrando ao “dono” também) que nada é descoberto e definido nas primeiras investigações, sem experências e provações a longo prazo. O EndoBranding é uma mão dupla de descobertas e envolvimentos, de perguntas e análises práticas em ações e atitudes. Indo muito mais além do “saber”, envolvendo ações de energizações culturais integradas com setor de recursos humanos, gerando resultados, participando do dia-a-dia da organização.

    Infelizmente, “não há tempo” e tudo se torna para ontem, estimulando a criarem regras e análises superficiais para se chegar a certeza, em pouco tempo. Dessa maneira, concordo sim, branding acaba sendo uma auto-ajuda organizacional e “um enorme alívio de consciência para quem paga”.

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