Que medo de não ser à toa na vida

Primatas evoluídos conseguem criar instrumentos para obter o que precisam. Alavancas para puxar, varas para bater, pedras pontiagudas para quebrar.

Os humanos são assim também. Criam a todo instante próteses funcionais para lutar por sua sobrevivência e preservação. Alavancas, varas, pedras pontiagudas, carros, aviões e computadores.

Mas os macacos não inventaram a televisão, os telescópios, os foguetes e o iPhone. Nem nunca serão capazes disso porque só os humanos são capazes de criar e conservar. Nós criamos e aprendemos. Nós criamos e aperfeiçoamos.

Nossos primos só criam, usam, jogam fora e esquecem.

Somos o que somos porque as coisas que criamos são eternas. Nós não. Somos humanos graças às nossas criações eternamente melhoradas por uma infinita cadeia de semelhantes. Cadeia que vem de trás, quando ainda não éramos, e anda para a frente, quando não mais seremos.

Entre nós, existem dois tipos de pessoas: aquelas que buscam fama e aquelas que buscam feitos. Ou, para certos, as inconfessáveis falácias de “buscar fama para fazer” ou de “fazer para a fama”.

A fama morre com a morte. Ou morre antes, com as rugas. Ou ainda, a fama se suicida com a vaidade que a alimenta.

Em nossos tempos, a fama é fácil e rápida. Se ela é fator de reputação coletiva, a conectividade em redes descentralizadas afama num estampido iluminado ou de sorte. De 140 caracteres, por exemplo.

Mas, assim como acontece num truque instantâneo, a reputação é uma vertigem. E nada, nada se aperfeiçoa da fama depois que ela some.

O homem, sozinho, mesmo que sua fama seja enorme, é uma miragem fugaz. O homem só existe para a espécie, para sua espécie, na medida em que é capaz de aperfeiçoar os feitos de outros homens.

A apoteose dos big brothers, dos nossos craques, dos nossos bandidos é tão inútil quanto o eclipse das nossas medalhas e das nossas aspas na mídia, se não formos capazes de nos perguntar, sempre: “O que fazemos para melhorar e perpetuar a espécie?”.

4 thoughts on “Que medo de não ser à toa na vida

  1. Parabéns pela abordagem feliz que você transcreve sobre um lado efêmero da vida, a qual como você ratifica que nos torna ínfimas miragens! Obrigado por descrever e resumir de maneira sútil e ao mesmo tempo ousada a escolha que temos entre o ser e o fazer junto à “espécie”… Abraço

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