Que tal ler enquanto pedalo e respondo às mensagens, dou uma paradinha para ligar para minha mãe que não vai nem perceber que estou ofegante porque ela fala muito e quando terminar passo ali para dar um beijo na minha amiga, mas a caminho bebo água, dou uma olhadinha nos e-mails e já organizo a saída daqui, a passada no supermercado, aproveitando para pegar as roupas no tintureiro, aproveitando para pegar dinheiro e aproveitando para também ir lendo os e-mails de novo e aproveitando para ligar para os recados do dia que, claro, já estarão dormindo, mas tudo bem, eu não quero mesmo falar, e aproveitando também para abastecer para economizar o tempo de amanhã, que vai ser todo aproveitadinho também porque, se Deus quiser, vou pegar um avião e aproveitar para dormir os 40 minutos que desaproveitei quando despencou a arara de roupa do closet.
A nossa vida está assim, aproveitadinha, que otimiza nosso tempo multitarefado, multiplataforma, multiconectado, multi-trans-midia-story-teller.
Temos que ser incrivelmente organizados, desumanamente disciplinados e extraordinariamente focados.
Nossa cabeça é uma checklist de geração espontânea, um processador de abreviações, um curto-circuito de reminders, uma agenda milimetricamente preenchida.
Afogados em minutos superaproveitados, a vida segue sem revisão, com a autocrítica disciplinada pela supervalorização da autoestima.
Um dia, nasceu uma flor no planeta do Pequeno Príncipe. Naquele planetinha tão pequeno, uma flor. Quem sabe viera de uma nuvem de pássaros em migração interestelar, ou sempre estivera lá, germinando sem fim. O Pequeno Príncipe extasiou-se com o botão da bela. Desenhou-lhe uma cúpula, fez-lhe guarda permanente, afinal, algum carneiro desavisado surgido de um mal ajambrado rabisco poderia ceifar seu desabrochar. Mas a flor não terminava de aprumar-se, maquiar-se, encher-se de formosura. Ela era muito vaidosa e seu admirador, muito solitário. Até que um belo dia ela despertou num raio de sol e, vendo-se refletida nos olhos do menino, chorou: “Meu Deus, estou tão despenteada!”.
E num piscar de olhos, aproveitando o cochilo do anjo da guarda, a gente morre, deixando uma vida muito mal aproveitada.
Vida cronometrada – http://www.alphen.com.br/2010/06/08/vida…
RT @Alphen: Vida cronometrada – http://www.alphen.com.br/2010/06/08/vida…
Não sei desde quando estou te seguindo no twitter, não sei como foi, a partir de quem, mas me sinto muito feliz por ter começado a seguir e ter o privilégio de ler o que vc escreve, há mais ou menos um ano. E são posts como esse que me fazem esperar ansiosamente o próximo.
Sou engenheiro agrônomo, trabalho, encerrei o mestrado recentemente, tenho namorada, pais… e parece que estou sempre devendo, gastando meu tempo, passo me perguntando como as pessoas conseguem ler 300 mil livros, assinar 450 mil Feeds, fazer 60 updates diários no twitter, fazer academia, se sentirem a vontade atendendo uma ligação de trabalho às 11 da noite, escrever no blog e a tese, publicar artigos e ainda acordam de manhã como que adorassem ter o café da manhã cronometrado. Ahhh e parecer cool, que se diverte as pampas.
Te confesso que eu resisto, esqueço o telefone em casa, vou ver o pôr-do-sol, deito no chão de casa pra brincar com o cachorro, mas cada vez mais a gente se sente cobrado, mesmo quando está com as responsabilidades mais ou menos em dia a gente não consegue mais baixar a guarda, não relaxa. Parece muitas vezes que curtir a vida faz com que pareçamos hippies, inconseqüentes. Eu ando me sentindo cobrado. Hehehe. Não sei se é lugar de desabafo mas acho que não desrespeito o post pois ele nos inspira a olhar pra dentro.
As vezes a gente escuta as pessoas usando a frase pronta que “não vieram nesse mundo a passeio”, eu queria passear mais nessa vida, e que aceitassem/aceitássemos também esse modo de vida.
Sério, post demais e comentário EXATAMENTE como eu sinto! Eu tb ainda resisto, ainda fico olhando pro teto sem fazer NADA, deito no chão pra brincar com os cachorros. Mas é bem como tu disse: não deixo de me sentir cobrada por não estar “produzindo” naquele minuto.