A Internet é mais que uma plataforma

Já existe mais de um celular por habitante no país e já, já vamos encontrar uma situação similar na Internet: as pessoas tendem a ter muito mais do que um ponto de acesso a ela.

Quando o F/Radar, pesquisa que calcula há 3 anos os comportamentos dos consumidores em várias áreas, inclusive Internet, a primeira providência na montagem do questionário foi tentar encontrar uma forma nova de acessar esse dado sem cair nos vícios burocráticos tradicionais (filtros inadequados, perguntas mal compreendidas etc.). Logo na primeira leitura, o número de “internautas” (palavra odiosa criada no ultrapassado apartheid digital) saltou significativamente em função da metodologia e principalmente porque em vez de medir a “posse” de acesso à Internet simplesmente mediu-se o acesso. Muitas pessoas (a maioria) não pagam uma assinatura de Internet, mas nem por isso podem ser consideradas excluídos digitais. Afinal de contas, lan-houses, pontos de acesso gratuitos, casas de amigos e parentes dão oportunidade a muitas pessoas que não podem pagar por um provedor, mas mesmo assim são “internautas”.

Mas ainda falta uma população muito grande de brasileiros com acesso à Internet muito pouco pesquisada quantitativamente. Trata-se de toda a geração de pessoas que nasceu quando a Internet já era relativamente popular: os adolescentes entre 12 e 16 anos. Quando começarem a ser contabilizados e estudados, o número deve saltar mais uma vez e, principalmente, veremos surgir, nos números, uma geração multiconectada, com hábitos e comportamentos muito distintos daqueles que se adaptaram.

Esses indivíduos, que somam mais de 10% da população brasileira, certamente têm a Internet como central nas suas vidas. A mesma centralidade que a televisão tinha numa geração anterior. É muito provável que, para eles, muitos paradigmas válidos para a mídia tradicional  estejam invertidos, em particular no acesso à informação e entretenimento. Para eles, a Internet é sem dúvida a  plataforma prioritária.

Quando comparamos as plataformas (Internet com TV, por exemplo), podemos inferir que a interatividade e a colaboração exercem uma mudança radical de comportamento nesse público. Um veículo que não considere essas duas características como centrais (e não adereços pseudomodernizantes como o fazem a maioria dos veículos tradicionais em suas plataformas digitais), seria um veículo com menos prestígio, credibilidade e popularidade.

Da mesma forma a velocidade no fornecimento da informação e a gratuidade do conteúdo são os alicerces de qualquer veículo que pretenda atingir essa geração, e consequentemente, a geração seguinte, daqui a alguns anos. Pagar por algo não palpável é um contrassenso para eles. Muitos pensam que a responsabilidade dessa maneira de pensar é dos veículos que disponibilizaram seus conteúdos de graça no início. É miopia pensar assim, porque o que está em questão é a própria credibilidade da estrutura tradicional de geração de conteúdo: broadcast de poucos para muitos. Na Internet tudo é de muitos para muitos.

Ainda, o conteúdo livre de direitos é outra pedra de toque para essa geração. Para eles, a reserva autoral de lei não é injusta, é incompreensível. A própria noção de autoria não é fator da origem criadora do conteúdo, mas da divulgação deste. Em outras palavras, criador não é quem cria mas quem espalha.

A questão central pra mídia não é mais a adaptação de plataforma (embora muitos ainda patinem nessa chucrute);  o fulcro da mídia na Internet é interatividade, colaboração, velocidade, gratuidade e uma nova autoria.

5 thoughts on “A Internet é mais que uma plataforma

    1. @Alphen vc leu a coluna da Lúcia Guimarães no Estadão de segunda: “No tempo das diligências”? Vale a pena.

  1. Não acho que nosso conceito de autoria seja incompreensível para as novas gerações. Acho que elas compreendem, mas não se importam. Ou seja, sei que o sujeito que criou isso aqui não vai ganhar nada se eu baixar, reproduzir, espalhar o que foi criado, mas vou fazer mesmo assim porque é legal, porque não tem consequências para mim ou porque quero mesmo é contrariar essa “propriedade intelectual”. Reconheço que é uma forma de pensar disseminada (e quem de nós nunca fez um downloadzinho de MP3, pelo menos?). Mas – penso eu, que vivo de ideias – sejam ou não essas novas gerações o futuro, seja ou não essa multidão de “internautas” (agh!) os futuros consumidores com quem teremos de falar, o respeitável público dos próximos decênios, por serem majoritários nunca vamos ter sobre eles uma posição assumidamente crítica? Por sermos mais velhos, nunca iremos emitir sobre eles um juízo de valor? Em suma, nunca iremos dizer que, sobre certos assuntos, eles estão errados?

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