Cinquenta e sete por cento dos brasileiros que acessam a Internet declaram que costumam “colocar” conteúdos online. Esse percentual sobe para quase 75% entre os jovens de 12 a 25 anos. Cinquenta e dois por cento desse conteúdo são fotos, surpreendentes 20% de texto (não estão inclusos aqui comentários) e estonteantes 19% de vídeos. O meio preferido – de longe – para postar esse conteúdo é evidentemente o Orkut.
Não existem estatísticas para se avaliar a qualidade dos conteúdos produzidos. Mas, ao invés de cair em análises mal-intencionadas, analisando de forma estatística quem são essas pessoas, em que classe estão e que nível de instrução possuem, para então avaliar a qualidade dos conteúdos produzidos – método clássico de reprodução de clichês retrógrados – mais revelador é passar algumas horas a esmo em plataformas de compartilhamento de fotos e vídeos, por exemplo.
Se formos capazes de usar da inocência e da boa-fé que nos restam, é muito provável que, ao cabo dessa experiência, duas constatações simples nos perturbem a mente.
Por um lado, iremos perceber que o tipo de conteúdo que a imensa maioria das pessoas “posta” difere muito daquele que produzimos profissionalmente. Ele é antes uma expressão do que uma elaboração, antes um pulso que uma premeditação, antes um reflexo do que uma intenção, antes uma forma do que propriamente um conteúdo. “Colocar” conteúdo online tem serventia. É uma ponte. É meio, e não finalidade. Já o nosso conteúdo (ou aquele dos nossos clientes), aquele que criamos para essas mesmas plataformas universais, é um avesso, seja por vício, seja por incompreensão. Um avesso que muitas vezes arrevesa.
Por outro lado, se não torcermos imediatamente o nariz, esse monte de fotos, textos e vídeos não respondem propriamente aos ditames da boa produção, são conteúdos que subvertem qualquer regra de fotografia básica, o vernáculo, a lógica narrativa e, por que não, por vezes, uma certa correção moral, ética e legal. No entanto, numerosas vezes esses conteúdos “duvidosos” alcançam audiências fabulosas. Assim, seremos compelidos a redefinir a nossa noção de qualidade. Qualidade, nesse ambiente online, é antes fator de espontaneidade, improviso, sinceridade e, principalmente, acima de tudo, liberdade. Já o nosso conteúdo ou aquele que somos convidados (compelidos?) a criar é cheio de regras, contingências e ambições que travam, de tanto perfeccionismo formal.
Conteúdo, se conteúdo devemos criar e suscitar, não é o conteúdo que concebemos. Qualidade, se qualidade buscamos e filtramos, não é a qualidade que sublimamos.
Na Internet vencerá sempre a Expressão Livre antes do Conteúdo de Qualidade.
Conteúdo na Internet é Conteúdo? – http://www.alphen.com.br/2010/12/07/cont…
RT @Alphen: Conteúdo na Internet é Conteúdo? – http://www.alphen.com.br/2010/12/07/cont…
Certo. Mas se um desses internautas for a uma empresa, fisicamente ou on-line, e encontrar um conteúdo caótico como o que ele mesmo é capaz de produzir, ele a levará a sério? Por que ele se sentirá intrigado, atraído, fascinado por uma mensagem em que ele mesmo pensaria? Eu me pego sempre com as definições de qualidade, que acho, todas, impalpáveis. Paulo Coelho tem qualidade? E Machado de Assis? Achar que Machado é melhor que Coelho é caretice? Gostar mais do anúncio do Whasington do que do cartaz xerocado que meu primo Zé usa pra vender a oficina dele é ser reacionário? E valorizar a técnica, que ordena o caos (e, em excesso, trava como vc diz), é ultrapassado? Sei não, acho que às vezes pensamos demais para fenômenos de menos. Quando o sujeito posta, é legal que seja improvisado, borrado, artesanal, bagunçado. É amador. Podemos estimulá-lo a fazer isso e premiá-lo pelo esforço. Talvez até contratá-lo. Mas quando uma marca se comunica, se for sempre assim uma zona, se não for organizado, benfeito, vai dar a impressão de pensamento e atuação desestruturados. Quem confiaria nela? Quem quer isso? Quando é uma empresa, é legal que seja coordenado, elaborado, direcionado, bem fotografado e produzido. É profissional.
Concordo Gustavo. Mas é importante a gente ter esses conceitos em perspectivas, também qdo a gente criar/produzir “profissionalmente”….não acha?
Acho. Concordo mesmo. Digo até mais: é importante termos todo e qualquer conceito em perspectiva. É um desafiador exercício de vida. Ah, e obrigado por publicar o texto certo. Um abraço.
Eu me pergunto se essa questão de “expressão livre” é interessante de fato. Podemos fazer a comparação com cinema, teatro, televisão: as maiores plateias normalmente são do conteúdo mais superficial. Faustão sempre terá mais público que Roda Viva e na minha opinião nunca será melhor.
Então, qualidade ou quantidade? Como equilibrar isso? Como ganhar com isso?
Bom questionamento, pois a internet é o reflexo do conteúdo das pessoas no mundo real. Se achamos o conteúdo de baixa qualidade, não adianta ficarmos criticando, mas sim trabalhar para mudar a situação.
Como bem colocado, é importante avaliarmos se não estamos sendo preconceituosos ao “julgar” a qualidade do conteúdo.
Creio que devemos ter humildade para compreender a diversidade, e com isso valorizar o que é novo.
O video da Regina Casé no TEDxSP é excelente para apimentar esta questão:
http://www.tedxsaopaulo.com.br/regina-case
Abraços,
Marcio Okabe
@marciokonfide