Atrofia de 140 caracteres

Imaginemos o ano de 2300.

A Terra tem algumas dezenas de bilhões de homens; florestas e praias estão em museus e falamos chinês fluentemente.

As pessoas são mais altas, mais velhas e mais ociosas do que nos séculos anteriores. O trabalho é um luxo, um hobby ou um vício.

A produção de todos os bens é automatizada, autossustentável e sintetizada, já que o planeta está oco como um queijo suíço.

Os governos não se preocupam mais com guerras, nem com exploração e beneficiamento de riquezas, mas com ocupação do tempo. Imensos movimentos de terapia ocupacional são subvencionados, mas a produção manual, artesanal ou artística gera insuperáveis acúmulos de sucata. Por isso, normas internacionais exigem licenças raras para a produção física. Todas as energias concentram-se nas manifestações virtuais perecíveis.

A humanidade inteira entrega-se à curtição. Estéril.

Não há mais luta de classe, nem de raça, nem de sexo nem de religião – que não há mais. Nem divergências políticas, nem polêmicas, nem de opinião. Não há fatos, nem história.

Nada de drogas, álcool, esportes, sexo. Angrybird virou mania global.

De volta aos anos 2000.

Quando o conhecimento vira consumo, a luta vira esporte e o cinismo, a religião, a preguiça é epidemia.

A curiosidade superficial, fruto dos estímulos de 140 caracteres e das simplificações indexadas, atrofia a existência.

6 thoughts on “Atrofia de 140 caracteres

  1. pra completar tua distopia, o Dr. Watson da IBM derrotou a raça humana num jogo de conhecimentos gerais. Obrigado, IBM, por nos liberar do fardo da inteligência. agora podemos ser fúteis sem culpa 🙂

    1. Tudo a fazer: brigue, brigue, brigue, brigue, brigue, brigue, brigue, brigue, brigue, brigue, brigue, brigue, brigue, brigue, brigue, brigue, brigue, brigue, brigue, brigue… até não poder mais. E se mesmo assim não adiantar nada, a luta terá valido a pena, porque é viva, e você terá, mesmo que um tiquinho, adiantado o relógio da história.

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