A panela de ferro e Rivaldo por Mário Daloia

Neste mundo onde craques e nem tão craques se comportam como grandes craques, um grande craque despertou-me a atenção neste último sábado dia 30, dia que eu iria ao Japão. Fora dos holofotes, e diferente daqueles craques e não tão craques para quem qualquer candeeiro ou lamparina é Cannes ou Hollywood, tive um dia de trabalho comum, dia de externa em um lago, de comida de fogão a lenha e panela de ferro meio que sem querer, de andar de barco de alumínio e motor minúsculo pela represa grande e cheia de braços que fez me sentir no amazonas.

Quando voltei das novidades, seria um dia só de estrada havia eu previsto, Santos e São Paulo jogavam a semifinal do campeaonato paulista. Daí vi um troço incrível. Com Paulo Henrique Ganso e Rivaldo em campo, o mais novo grande meia-esquerda e o último grande meia-esquerda que o país do futebol produziu, Rivaldo o gigante que foi já escolhido melhor do mundo, que fez o Nou Camp lotado, o estádio de Barcelona, 85 mil catalães, balançar seus lenços brancos quando fez um gol de bicicleta no último minuto de jogo contra um Valência enorme, depois de já ter feito outros dois no mesmo jogo e o adversário ter sempre empatado, e valia título, Rivaldo o gigante, que fez o Giuseppe Meazza, o estádio de Milão, lotado, 90 mil milaneses pedirem em coro para que ele ficasse quando, ciente que não passava por boa fase e ganhando salário de grande craque, foi ao gramado de terno pedir desculpas e dizer que iria embora (disseram na época que um problema com a esposa, ela o teria abandonado, e por não ter 100 loiras de calça gang no seu camarote, o levou a um momento de reclusão).

Esse gigante que com Ronaldo, o fenômeno, ganhou uma Copa para o Brasil, num time em que jogava os nem tão craques Kleberson e Gilberto Silva, esse gigante jogou aos 38 anos a semifinal nesse dia 30. Diferente dos craques e não tão craques que se comportam como grandes craques, Rivaldo o gigante, saiu do banco de reservas e correu e tocou na bola como jogador em inicio de carreira, buscava a bola mais atrás, coisa que pouco fazia quando mais moço, e nessa semifinal, sem opção para genialidades, já que o Santos adversário estava fechado fechado, e afinal aos 38 anos ele não é mais um Messi aos 22 anos, Rivaldo tocava e corria para receber, e tocava e corria e tocava e corria, parecia querer agradar à torcida e ao técnico. Jogou como um iniciante, provavelmente como ele próprio jogou quando chegou de Pernambuco, antes de ser o Rivaldo, o gigante, o genial, o bailarino magnífico de 1,90 de altura, o meia-esquerda elegantíssimo, de passadas imensas. Nesse dia 30, dia que não fui ao Japão, e da panela de ferro, saltou aos olhos essa lição de humildade desse retirante genial, neste mundo cheio de craques e não tão craques que se tratam como grandes craques. E Rivaldo nem muito fez, mas correu, se entregou, e nem precisava.

Lembrou-me do dia que Jean-Baptiste Mondino, grande craque fotógrafo, veio apertar a mão de um menino estagiário, que lavava prato no plateau do estúdio (mal comparando foi como se você fosse apertar a mão e dizer bom dia e obrigado para aquela mulata vestida de copeira para quem você dá a taça vazia de champagne). Rivaldo o gigante talvez mesmo por timidez, comporta-se de maneira única, só dele, não vestiu o estereótipo mais a mão, mais fácil e no final mais ridículo, comporta-se como um homem de verdade, único, humilde e solene, um gigante.

Ficou a impressão que o resto é lixo que a gente recolhe e descarta para o caminhão levar.

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