Criação e planejamento, a gangorra

Há quatro diferentes maneiras de fazer planejamento de comunicação em uma agência.

A primeira é quando planejar significa exatamente planejar, ou seja, concatenar ações, mensagens e estratégias no tempo. Esse “tempos e movimentos” é uma administração crucial mas deixou a área de planejamento para incorporar-se nas disciplinas de atendimento. Não é planejamento, pelo menos como se define hoje a área, mas gerência de projeto.

A segunda forma de planejar nasceu nos luais psicanalíticos e ripongas. Defendida pela turma das ciências sociais, por inflamadas tietes de Lacan ou Lair Ribeiro (dependendo do pedigree acadêmico), esse é o planejamento pesquiseiro e enfezado, que se vê, projeta e faz amor com arquétipos. Numa agência de comunicação, essa turma faz o que chamamos de retroplanejamento: “chama a bigoduda para provar que minha ideia é incrível”.

A terceira prática foi sevada na opressão tirânica da Criação das agências. Um ódio selvagem e reprimido contra as musas que iluminam infantilizados criativos formou planejadores intelectuais, super-hipertendência, que dissertam sobre Bocuse e Marcuse com a mesma flatulência. Em uma agência de comunicação, esse pessoal moderno faz o protoplanejamento: “manda aqueles moleques mimados da criação executarem nosso power-point”.

Finalmente, a quarta maneira de planejar, como reação à segunda – subserviente – e à terceira – pretensiosa, é o antiplanejamento. Esses planejadores são híbridos assumidos, camaleões com talento para as artes circenses. Escorrega-se aqui pelas práticas, de acordo com as circunstâncias, os objetivos e as plateias. O planejamento de comunicação é aqui retro ou proto, abre-alas ou anunciação, pedestal ou redenção, alavanca e contra-peso, depende. Depende da ideia, depende da necessidade.

Esse é o planejamento que não acredita na tabuada das pesquisas, nem no blablablá metafísico. O planejamento dos bastidores assumidos, que existe para que brilhe o que deve brilhar. Nem dados, nem teorias, nem metodologias, nem egos, mas a comunicação que vai pra rua, que vai ser vista, curtida, lembrada, que influencia, cria desejo e prazer.

A inspiração não nasce da reação de fórmulas previamente experimentadas. Ela tem sua dose incidental e mágica. Por isso é refratária ao método quando ele se impõe dogmaticamente.

Criar e planejar parecem práticas inconciliáveis a menos que ambas sirvam de alacanca uma para a outra, qual uma gangorra equilibrada e divertida.

7 thoughts on “Criação e planejamento, a gangorra

  1. Realmente a gente deveria se preocupar menos com os egos e com as métricas e focar em um trabalho que conquiste as pessoas!

  2. O problema é que 90% dos planejadores que conheço planejam das 3 primeiras maneiras citadas, mas juram de pés juntos (inclusive pra eles próprios) que planejam a quarta maneira. Ótimo texto. 🙂

  3. impossível não lembrar o que o júlio ribeiro disse no GP, ontem: “não confiem no pensamento. o pensamento é operário. e planejamento é inspiração”. adorei seu post, fernand. eu venho de uma escola em que planejamento vinha antes e criação depois. hoje em dia… nem sei se o que faço é planejamento mais. é meio zoneado, meio todo mundo junto … não me sinto a sabichona de antes ;o))) mas tá mais legal. é isso aí!

  4. Isto está perfeito como um do-ré-mi-fá ao serenar, pelos ouvidos, os temores dos noviços mais rebeldes. Imagine o sorriso dos maestros ao suporem suas baquetas impulsionando prazeres gangorrados sem desequilíbrios egolátricos!

  5. Existem 3 milhões de formas de fazer planejamento, cada uma com a cara do respectivo planejador. Mas, para efeito de generalização, escolho a gangorra: fico com a reciprocidade, o prazer e o não dogmatismo do “antiplanejamento”. É o seu?

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