A culpa e a Internet

A Internet foi um enorme salto quantitativo na comunicação interpessoal. Encolheu o tempo e o espaço. Mais rapidamente interagimos, resgatamos relações esquecidas e tanto faz se estamos a cem ou cem mil quilômetros de distância. E tomamos gosto com essa incontinência comunicativa. Isso nos dar uma espécie de poder sobre a vida alheia. O poder de saber, de bisbilhotar, de se exibir também. Dá-nos a sensação de estar quites com os outros e com nós mesmo. Um simulacro de autossuficiência.

Fora isso, tem o balsamo ao egoísmo e à culpa.

Antigamente, dava trabalho relacionar-se com pessoas. Era preciso tempo, foco e renúncia. Se alguém partia, era necessário esperar o correio para reatar sentimentos e saudades. Se alguém sumia, era preciso suor para reencontrar vestígios e coragem para religar as pontes. Se alguém adoecia, era preciso levar laranjas e flores e padecer na cabeceira. Antigamente, toda ausência era mais sofrida e mais intensa. Uma relação que se mantinha era um cimento.

Hoje os relacionamentos banalizaram-se na medida em que os obstáculos – os tempos e espaços – foram removidos ou ilusoriamente substituídos. Basta um email de vez em quando para dizer que se ama. Basta uma busca no facebook para reatar. Basta um SMS para prestar solidariedade. Basta um ou dois cliques para sentir-se menos egoísta e culpado.

Talvez devêssemos encontrar outras palavras para qualificar relacionamentos, amizades, amores de antigamente. Ou talvez essas relações mais viscerais, profundas e ricas não passam de literatura.

Apesar da parafernália que nos une, estamos cada vez mais enganados e isolados.

One thought on “A culpa e a Internet

  1. Este texto é a síntese perfeita do que representa a internet para a vida das pessoas hoje. Vou deixar a exemplo um fato que constatei e se encaixa bem no contexto, há alguns anos quando alguém viajava ou participava de algum evento ou coisa do tipo, tirava-se fotos com rolo de filme, depois as revelava e eram colocadas naqueles pequenos albuns de capa de papel/papelão que as próprias lojas de revelação davam de brinde, e então quando alguém te visitava ou você ia visitar alguém, levava esses pequenos albúns para que a pessoa pudesse ver as fotos e o protagonista das fotos explicar como foi a viagem ou o evento, com o advento das cameras fotográficas digitais era a mesma coisa, mas tudo digital, mostrando as fotos ou na TV, ou no computador, ou até mesmo na própria camera, mas eis que surge um site chamado “Facebook”, e então as pessoas não fazem mais isso, apenas dizem “Entra no meu Face, e vê as fotos da minha viagem”. É Bem assim, e aposto que todo mundo conhece alguém que faz isso, virou um hábito, a pessoa chega de uma viagem, ou as vezes até durante a viagem, quer upar fotos pros amigos (ou curiosos), ficarem sabendo que você tá tomando água de coco na Bahia, ou tomando chimarrão no RS, até ai tudo bem, é até melhor, porque é um saco ir na casa de alguém e a pessoa dizer: “Ai, vem cá, quero te mostrar as 386 fotos que eu tirei da minha viagem, algumas estão borradas (50% das fotos), mas ficou legal as fotos.” Ai ninguém merece!!! Sem falar que tem que avisar que existem sites e rede sociais proprias pra postar imagens, tipo Flickr, Instagram e etc… Quem sabe na próxima revolução da informática o povo descubra que a internet não se resume em “Facebook”!?

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