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O tabu ético da propaganda

A ética é um tabu na propaganda. Parece que trabalhamos em função de uma lógica paralela – a comercial – que urdiu estratagemas muito poderosos para desviar-nos de nossos valores.

Um exemplo caricato: certa vez propôs-se a um cliente de varejo, uma contundente estratégia de merchandising em cultos religiosos. O target estava cercado e a mensagem era contundente. Infalível. Deus, através de seu pastor, recomendava. Quem haveria de resistir?

Nu na frente do espelho, o publicitário sempre recorre a um álibi poderoso que justifica suas escapadas éticas: culpar o cliente e seu apetite descontrolado. Estamos a soldo dos briefings e por isso, somos mocos – ou aéticos.

Há também aqueles que afirmam, sem nenhuma vergonha, que em nome da liberdade de escolha, tudo pode: acredita quem quer, adere quem quer, compra quem quer. Assim seria se a propaganda não mobiliasse uma parte colossal de nossos estímulos sensoriais diariamente. Mas liberdade sem informação é retórica.

E por falar em informação, toda dúvida virá acompanhada de seu protocolar “disclaimer”. É a lei que nos protege, o salvo conduto para a derrapada.

Por que o tabu? Porque somos criativos soltos, odiamos cabrestos e ironizamos o politicamente correto castrador. Algum jumento afirmou que a irresponsabilidade é um fermento generoso. E porque somos peter-pans super nutridos, super remunerados e super celebrados, a gente pode tudo.

Nu na frente do espelho, nu sem artifício nem pose, talvez a gente não se ache imune da responsabilidade de mentir, omitir, fazer que não é com a gente.

Talvez não seja só com a gente. Mas não custa tentar posar de ingênuo ao invés de irresponsável. E da próxima vez que alguma coisa arranhar nossos valores adormecidos atrás de tanta vaidade, vamos posar de loiras ingênuas e perguntar “está certo isso?” ou “será que não tem outro jeito?”