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O mea-culpa da mídia de massa

“O jovem está menos na TV por causa da Internet”, “O hábito de consumo de mídia mudou por causa da Internet”, “A TV e o jornal morreram por causa da Internet”, Blá-blá-blá-blá-blá.

Profetiza-se muito sobre o futuro das mídias e, apesar disso secretar uma interrogação perturbadora, uma
espécie de dor de cotovelo ou um entusiasmo reacionário, ninguém ousa mais revelar suas angústias.

“A plataforma não interessa mais”, “As plataformas são complementares”, “A TV tem que convergir pra Internet”, “A Internet tem que convergir pras outras mídias”, Blá-blá-blá-blá-blá.

A conclusão de dez entre dez raciocínios bem-pensantes do “novo papel das mídias” passa inconscientemente por uma espécie de fatalismo: “Vamos nos adaptar, a Internet é uma realidade”. Conclusão essa que resulta num mash-up trágico: conteúdo televisivo na Internet, internauta na televisão, e por aí vai para citar só alguns.

E agora, a questão não é mais apenas entender o funcionamento de cada mídia, o papel do conteúdo em cada plataforma, o formato, a gramática e a linguagem de cada meio.

Talvez seja mais construtivo entender a Internet como consequência e não causa. Não é “por causa da Internet que a TV deve ser isso ou aquilo”, mas porque a TV é isso ou aquilo, que a Internet é o que é.

Em outras palavras, energia de mais é investida em adaptar as mídias antigas ao ambiente digital e energia de pouco em pensar como as mídias antigas deveriam se adaptar às novas demandas das pessoas. Não é por causa da Internet, é por causa das pessoas.

Antes de assumir a derrota, deveríamos assumir os erros. Antes de pensar na Internet, deveríamos pensar nas nossas mídias “antigas”. E pensar nas mídias antigas não deve significar necessariamente “internetizá-las”.

Não é só porque as pessoas querem participar, não é porque as pessoas não aceitam mais a estrutura hierárquica da difusão de informação e entretenimento, que as mídias antigas estão ameaçadas. É porque elas erram em outras lógicas próprias, de formato e linguagem, que elas despertaram nas pessoas essas vontades.

Essa inversão de raciocínio é muito mais excitante e desafiadora: como é que voltamos a ter importância, como é que voltamos a cativar o jovem, como é que voltamos a ser hábito, sem mexer uma única linha na lógica das mídias de massa, por definição de poucos para muitos e com uma postura passiva das audiências?

Ressuscitem São Tomé

No último relatório da Organização Sul-Africana para o Desenvolvimento da Pesquisa Científica (SACR), pesquisadores da ou University of Cape Town anunciaram o isolamento de um vírus de computador de incontrolável efeito. Nada de muito novo, não fosse esse um vírus de verdade, como os que nós humanos pegamos a torto e a direito. Um vírus orgânico.  Para Jackson Jukjevick, autor da descoberta, “a agressividade desse vírus é tal, que ele atua não somente nos softwares e sistemas operacionais, mas nos circuitos internos dos computadores”.

Uma lei acaba de ser aprovada pelo Senado francês: pessoas que se apropriam de conteúdos regidos pelas leis universais dos direitos autorais copiando-os em seus ambientes digitais são passíveis de prisão inafiançável. Embora a lei não pareça surpreendente, um dispositivo especial também foi aprovado, segundo o qual não são necessárias provas formais da cópia, bastando apresentar uma impressão de tela do conteúdo copiado para caracterizar crime.

Um hacker inglês entrou mês passado nos servidores da Wikipédia em sua versão romena e, fazendo uso de um robô, alterou todas as definições ali encontradas, negando todas as afirmações. Todas. Por exemplo: onde se lia “a Mona Lisa foi pintada por Leonardo da Vinci”, lê-se agora “A Mona Lisa não foi pintada por Leonardo da Vinci”. O engraçadinho ainda teve requintes de substituir autorias como, por exemplo, no caso da lei geral da gravidade, o hacker atribui a formulação ao obscuro cientista romeno Vladislav Marinono.

É tudo verdade? Não. Essas afirmações foram integralmente criadas para o propósito desse artigo. Mas digamos que essas pequenas mentiras tenham sido publicadas blogosfera afora e que elas tenham tido alto poder de contaminação. Em tempos de informação fragmentada, em tempos de desvirtuação das autorias, em tempos de bagunça virtual, a veracidade é diretamente proporcional à capacidade de reprodução. Toda mentira tem seu momento de glória na Web.

Ainda vivemos em um momento de incipiente anarquia. Mas ela promete piorar muito. Ainda convivemos com o conforto proporcionado por velhas (decrépitas) instituições. Enciclopedistas ainda existem. Dicionaristas idem. E livros e publicações e outras mídias centenárias. Mas não por muito tempo. A menos que…

A mídia (velha) morre a cada dia um pouco, quando tenta competir com criação e produção de informação. Como competir com milhões, bilhões de autores ensandecidos? Como competir com a gratuidade dos conteúdos postados por qualquer mané? Como competir com bilhões de correspondentes que testemunharam o fato in loco? A menos que…

A menos que a velha mídia ressuscite e cumpra um novo papel. E seu papel talvez tenda a ser uma espécie de “autenticador de veracidade”. Em vez de criar, validar e dar provas.

E, em tempos de informação push, recebemos o que nos interessa a qualquer momento, em todas as plataformas. A velha mídia ganhará um renovado valor quando ela for capaz de vender a comprovação.

Vem aí, em breve, o reconhecimento de autenticidade on-line que filtra o joio do trigo, o gato da lebre, a verdade da mentira. Uma espécie de São Tomé virtual.

Como salvar a mídia (e a propaganda)

A mídia está morta. Viva a mídia!

Estamos no futuro porque é muito mais fácil pensar assim.

Há alguns dias, uma crucial reunião decidiu o futuro da mídia, dos autores, dos criadores e de todos os pretensos provedores de conteúdo. Da assinatura do termo resultante, acordou-se que doravante tudo será cobrado. Chega dessa palhaçada de trabalhar de graça. Nem uma linha mais será derramada sem reciprocidade financeira. Nenhum jornal será lido mais de graça na internet, nenhum vídeo baixado ou assistido sem pagar, nenhuma música, nenhuma foto, nenhum game, nenhum outro conteúdo que tenha a mais ingênua pretensão de assim chamar-se vai ser franqueado, barganhado na xepa.

Muitos choraram na reunião que celebrou o acordo. Lágrimas de alívio carregadas de deliciosa vingança. É o troco, depois de anos de lamúrias e penúria. “Vencemos os anarquistas bandidos!”

Mas alguns dias depois, as cabeças decisivas reuniram-se novamente para colocar em prática a mais difícil das equações: como cobrar? O que cobrar? O que será justo e rentável?

A reunião foi uma tragédia. Dizem que alguns chegaram às vias de fato, e algumas mortes foram contabilizadas. É o que dizem, mas ninguém soube de nada porque nenhum leitor quis comprar esse conteúdo.

Flashback. Hoje, a questão que movimenta dez entre dez pessoas de mídia é como resolver a mais apavorante das equações: o conteúdo deve ou não ser gratuito?

Walter Isaacson discursou recentemente sobre o assunto num interessantíssimo artigo. Sua visão é lapidar, precisa, contundente. Em resumo, Isaacson propõe uma saída para a crise com uma simples e desburocratizada cobrança pontual (micro) dos conteúdos desejados. Essa possível solução, para ele, resolveria as perdas de receita dos jornais na ponta “venda de jornal”.

Ainda que essa solução não seja nova e já tenha sido experimentada (de forma fracassada), vale muito a provocação.

No entanto, não basta debruçar-se sobre essa “perna” capenga da receita, assumindo que as demais estão fortes. É tapar o sol com a peneira.

Talvez seja mais pertinente e urgente debruçar-se sobre a outra: a publicidade. Não apenas porque ela é mais importante, mas principalmente porque ela também cambaleia e há mais tempo.

Por outro lado, é tocante a ingenuidade porque as pernas são promiscuamente comunicantes. A questão não é, portanto, resolver partes separadas de receita, mas encarar a questão de face, sem preconceito, sem medo e de forma radical: quem vai pagar o conteúdo produzido? Pois parece que sempre será o cliente do conteúdo, direta ou indiretamente. E é o indireto a mola do sistema: a propaganda.

A propaganda “compra” audiência, e os provedores de conteúdo “vendem” audiência. É essa audiência que paga a conta. Se resolvermos essa perna, o conteúdo poderá ser gratuito sempre.

Ainda que pudéssemos precificar um conteúdo, ainda que pudéssemos nos entender sobre esse preço, quem nos compra tenderá sempre a não querer pagar. Eles também são tão variados, que a conta será ínfima, ridícula, dispensável. Sem falar da enorme dificuldade de criar uma forma de pagamento segura e simples.

Se nossa audiência não quer mais pagar pelo conteúdo – seja porque ele foi dado um dia de graça, seja porque o conteúdo é, e sempre será, mais importante que o autor, a cópia gratuita, portanto, tem exatamente o mesmo valor do original – de que serve remar contra a maré?

Existe muita coisa para ser feita e cobrar “microtaxas” é uma   solução microscópica.

Primeiro fato aterrorizante: as receitas publicitárias talvez estejam também minguando. Ou pior, talvez os anunciantes não estejam muito felizes com os resultados dos seus investimentos.

Segunda tragédia: na gênese desse problema, infinitamente mais relevante para as economias dos provedores de conteúdo e para os próprios pagadores da conta, os anunciantes, está a ineficiência dos formatos de publicidade e da lógica de precificação desses formatos.

Terceiro pavor: os meios digitais, gratuitos, livres, sem controle possível e infinitamente mais poderosos que qualquer outro meio físico vão quebrá-los. E nesse ambiente, só prevalece uma lei: a gratuidade.

Se formos corajosos, uma vez na vida que seja, devemos assumir essas verdades e, se quisermos encontrar uma saída, talvez devêssemos encará-las de forma exagerada, sem meias soluções, sem acochambros.

Na perna da publicidade, a idéia do “micro” talvez seja uma saída muito mais original.

Voltemos ao futuro agora. Lembram da reunião que terminou em sangue e morte?

Pois num outro lugar, um dono de jornal resolveu declinar do convite de participar dessa tragédia anunciada. Ele estava muito ocupado com seus jornalistas e programadores para perder tempo com panacéias jurássicas.

Ele estava lançando o primeiro jornal do mundo a vender publicidade baseada na lógica do micropagamento publicitário. Simplesmente indexou todas as palavras e expressões de seu conteúdo. Todas eram ofertadas a quem pagasse mais por elas. E ele foi mais longe: o leitor que fizesse a busca na sua ferramenta para um conteúdo específico seria imediatamente direcionado para ele, mas uma propaganda iria interromper por alguns instantes esse fluxo. Propaganda essa, paga pelo anunciante que tivesse comprado precisamente aquela palavra ou expressão.

Simples. Muito simples e fácil.

Algumas pequenas regras para ajudar na solução:

– Conteúdo deve ser de graça para o receptor.

– Quem paga a conta são os compradores de audiência, os anunciantes.

– Provedores de conteúdo devem priorizar a busca em detrimento da navegação aleatória, baseada em índices, cadernos, editorias, etc.

– O conteúdo deve ser todo indexado de forma dinâmica e automática.

– A venda de impacto publicitário deve ser feita pela compra desses “indexadores”.

– Leva quem paga mais pela compra dos “indexadores”.

– A propaganda deve interromper o clique da busca e intrometer-se entre ela e o resultado.

– A interrupção deve ser suficiente para impactar sem prejudicar.

– A compra de mídia passa a ser compra de conteúdo, e não mais de espaço.

– E para terminar, valem todas as regras anteriores: liberdade, qualidade, criatividade, pertinência, ética e principalmente, sempre, coragem de se reinventar todos os dias.

Vamos enterrar nossos mortos, rezar por eles, mas sobreviver.

Enquanto a senha não vem…

Eu queria propor um debate e que venham os polemistas de plantão.

Imaginemos que a gente possa planejar mídia por conteúdo. Ao invés de centrar nossos planos por veículo, a gente comece pensando nos seus conteúdos.

Vamos pegar um exemplo clássico. O seriado Lost é assistido por muita gente: alguns na TV Globo, outros no Terra, outros baixam da Internet, e mais um punhado olham picado no Youtube. Tem ainda quem além (ou ao invés) de assistir só fica bisbilhotando (ou lambendo) os blogs que comentam o seriado ou aqueles que só lêem as resenhas dos seriados. E tem os doidos que fazem tudo isso e ainda criam outras histórias paralelas, livros paralelos, quadrinhos paralelos, vídeos paralelos.

Muito bem. Se a gente pensar primeiro no conteúdo porque ele é pertinente com o conteúdo publicitário que eu quero para a minha marca, em que mídias anunciar? Que espaço comprar? Talvez nem todos sejam compráveis, mas é possível imaginar um jeito de se associar à maioria desses pontos de contato. E também é possível imaginar que todas as audiências podem ser mensuradas para justificar o investimento.

Quanto ao meu conteúdo “publicitário” se ele for apenas “afim” (que tem afinidade) talvez mais simples e efetivo fosse fazer um “product placement”. Resolve a questão da audiência máxima e pertinente.

Só não resolve a sagrada separação entre o que é puramente editorial e o que é comercial.
E aqui está o X da questão (e não aqueles X jurássicos).

Como é que eu faço para conseguir estar “junto” com todas as “mídias” que veiculam o conteúdo que interessa sem ser promíscuo? Porque é certo que, ainda que seja possível, é muito provavelmente inviável porque caro demais. Já imaginaram a quantidade de gaiato leiloando seu conteúdo “Lost related”?

Talvez, nesse X esteja o caminho da verdadeira renovação criativa.

Talvez a gente devesse criar “de acordo” com essa afinidade de conteúdo outro conteúdo, complementar.

Talvez a gente devesse ser capaz de criar conteúdos tão pertinentes e impactantes quanto Lost, associados com uma marca.

Talvez a gente devesse criar conteúdos publicitários para cada um dos pontos de contato possíveis.

E talvez tudo ao mesmo tempo.

Sacaram o desafio e como nosso ofício pode ser excitante?

Sugiro abolir a palavra mídia

Em tempos de fragmentação dos meios; veículos noticiosos, veículos noticiosos de esporte, de culinária, de automóveis, de gatos siameses, veículos técnicos, veículos técnicos de esporte, culinária, automóveis, gatos siameses, veículos de fofoca, veículos de fofoca esportiva, gastronômica, automotiva, felina do Sião; que sentido faz classificá-los ainda pelos seus dispositivos de recepção: Revista, Jornal, Rádio, TV, Internet?

Em tempos de convergência dos meios; rádios que estão nas ondas e na Internet e na TV, jornais que estão no papel e nos bits e na TV, revistas que estão em todos os lugares e blogs que viram programa de televisão que viram programas de rádio, propagandas que viram filme que viram game que viram blogs que viram sites de jornalismo colaborativo que viram livro; que sentido faz classificá-los ainda pelos seus dispositivos de recepção: Revista, Jornal, Rádio, TV, Internet?

Sempre que nos perguntamos “para onde vai nossa verba”, é uma simplificação preguiçosa dividir os investimentos da forma que fazemos.

Mesmo que a gente raciocine em termos de “atitude” do receptor diante da mensagem, TV – anestesiado; Internet – excitado; Jornal – desperto; Revista – sintético; ainda assim o raciocínio é no mínimo raso porque quem garante que a TV não pode excitar, investigar, opinar? Ou a Internet hipnotizar, adormecer, manipular?

Da mesma forma, não significa mais nada dividir o bolo publicitário em tipos de mídia, assim como não significa mais nada falar em verbas de comunicação por meio, ou discutir se agências de propaganda devem ser especializadas nessa ou naquela plataforma de comunicação. Soa quase ridículo dizer que um redator é melhor em “off-line” e idiota em “on-line”, um planejador que manja tudo de internet e nada de experiência de marca, um mídia que sabe fazer “x” e incapaz de programar palavras chaves ou contratar blogueiros. E se não é ridículo, é no mínimo, um mínimo inaceitável hoje.

Um veículo de comunicação não limita mais sua atuação ou se o faz, é uma opção poética. Dizer que O Globo é só papel é ofensa grave, gravíssima. Dizer que a Rede Globo é um entretenimento de sofá, idem. Um anunciante não é um anunciante de TV ou de Jornal. Uma agência – ainda que persistam as irritantes separações de disciplinas – não pode ser uma coisa tão pequena, terra de especialistas bitolados e caretas.

Porque um veículo de comunicação é uma marca antes de ser uma mídia. Um anunciante, idem. Uma agência, várias.

Porque um veículo de comunicação é um conteúdo antes de ser uma mídia. Um anunciante, idem. Uma agência, vários.

Vamos fazer planos de mídia por marca e por conteúdo.

Vamos trabalhar os conteúdos das marcas e não esse onanismo metafórico que consiste em inventar atributos emocionais e posicionamentos que mais parecem xavecos desastrados.

Vamos criar idéias e não filmes, anúncios, banners ou eventos.

E vamos também desistir de vez em chamar as pessoas de consumidores. Que palavrão!

Propaganda, targets e mídia: bagunçou

Mídia. Como é? São dois os cálculos possíveis. O primeiro é otimizar o dinheiro que tenho, o segundo é descobrir quanto dinheiro é preciso para alcançar os objetivos. Como não poderia deixar de ser, ambas as alternativas são regidas pela lei do custo X benefício onde benefício significa “quantas pessoas serão impactadas”.

Para cálculos são necessários números e para números são necessárias pesquisas. Para pesquisas é necessário controle e para ter controle é necessário isolar variáveis – coeteris paribus. Quanto mais variáveis, menos controle e quanto menos controle, menos idéias e quanto menos idéias, menos inovação e quanto menos inovação, menos ação e quanto menos ação, menos dinheiro e quanto menos dinheiro, menos tudo.

Daí a gente tem que explicar para a propaganda que não existem mais meia dúzia de veículos com força suficiente para impactar os públicos, mas milhões. Daí a gente tem que explicar para a propaganda que os veículos são feitos pelos próprios públicos que queremos impactar.

Tilt 1: a mídia é o target e o target é a mídia.

E a mensagem? Como é? São dois os raciocínios. O primeiro é dizer o que as pessoas dizem. O segundo é dizer o que as pessoas vão dizer. Como não poderia deixar de ser, ambas as alternativas são regidas pela lei do mínimo denominador comum, sendo que esse mínimo aí é o que todos os públicos vão entender.

E para encontrar esse mínimo aí, precisa de pesquisa. Nesse ponto o raciocínio volta a ser o mesmo. Pesquisa tem que ter controle, para ter controle tem que ter poucas variáveis e por aí vai.

Daí a gente tem que explicar para a propaganda que a mensagem que melhor funciona com nosso público é aquela que o próprio público faz. E a mensagem que o público faz é um monte de mensagens. E esse monte de mensagens é um monte. E se é um monte, tem um monte de mínimos denominadores comuns. Daí a gente tem que explicar para a propaganda que o mínimo denominador comum não impacta o máximo de pessoas possíveis.

Tilt 2: a mensagem é o target e o target é a mensagem.

E a esses dois tilts, como é que o mundo do marketing reage?

O mundo do marketing reage de duas maneiras: como uma avestruz ou como um hiena. Enterra a cabeça e espera que a manada faça greve ou se regala com a carniça e gargalha.

Mas que jeito a gente dá então para explicar que está cheio de tilts no circuito?

Rede Globo: resistindo ao dogma.

Por vezes, as equações funcionam tanto que esquecemos como elas funcionam. É natural. Perigoso, porém, é quando passamos a adotá-las como teoremas, portanto, inquestionáveis. E novas equações são construídas sobre equações / teoremas e assim sucessivamente, até perdermos completamente a capacidade de recuperar os teoremas primordiais, aqueles que permitiram a primeira equação. Devemos lembrar, ainda, que aqueles teoremas, os primordiais, estabeleciam em que circunstâncias eles eram verdadeiros. Em determinado momento, contudo, as circunstâncias mudam, e continuamos com as mesmas equações que já viraram teoremas.

Vamos falar da equação “Quanto mais simples e básico o conteúdo, maior a audiência”. Era uma simples equação ou um credo da grande mídia. Virou teorema ou dogma.  Teoremas e dogmas não se discutem.

A mídia de massa, a grande mídia ou a maioria dela, azeita-se por essa implacável lógica. Pior, o crítico deixa lugar ao cínico, e a programação descamba para o mais básico dos básicos, o primário, o primata.

Entretanto, a televisão brasileira não é mais apenas mídia de massa, é uma mídia universal. Onipresente e onisciente. A televisão é, no Brasil, o Olimpo da informação, do entretenimento, do conteúdo, da educação, da cultura.

Reflitamos um pouco sobre a massa, a audiência universal de dezenas de milhões de fiéis adoradores deste Olimpo. Como um indivíduo, sozinho, controla seus impulsos e reflexos básicos? Pensando. Pois, se isso é válido para um indivíduo, a lógica é inversamente proporcional quando a essa pessoa se somam outras e outras e outras. A massa não pensa, logo, não tem capacidade de controle dos impulsos e reflexos básicos. Somando a isso o fato de a televisão ser uma mídia de natureza “passiva” e aquele credo ou dogma da audiência, conclui-se facilmente que a baixaria é o que pega.

Posto o cenário, existem, no entanto, diferenças quando olhamos para o particular. A televisão, ou melhor, as emissoras não são todas iguais e não exploram o cenário com a mesma intensidade cega. Uma em particular ainda fundamenta sua produção em princípios que fazem uma resistência inteligente à vulgaridade.

Seu padrão de qualidade ainda preserva o valor de entender que as circunstâncias mudaram, tanto com relação ao conteúdo – por vezes combalido e dramaticamente arranhado – quanto à política comercial. Ele também leva em consideração o fato de a televisão não ser mais só uma mídia de massa, mas uma mídia universal. A emissora sabe que ela é, no Brasil, o Olimpo da informação, do entretenimento, da educação e da cultura.

Sorte nossa ela ser a líder.

O ataque dos clones e a mídia.

É a mídia que está ficando a cada dia mais careta ou as pessoas? Tudo é politicamente correto ou, traduzindo, moralista, babaquista. “Quem tem muito poder, tem muita responsabilidade”, diria o moderno Spider Man. Coisa mais chata não tem.

No cinema, grande público é assim: um homem ama uma mulher, se apaixona por outra e, como por encanto, deixa de amar a primeira. Isso é assim mesmo, na vida real? Lembra do Dr. Jivago que amava duas lindas mulheres e nunca teve que escolher?

Outra. Drogas é horrível, deprimente, um terror. Então, toda cena que envolve o assunto tem que mostrar a sarjeta, a lama, a privada emerdalhada. Será que é assim na vida de todo dia? Lembra de “Jesus Cristo Superstar” ou “Laranja Mecânica”? Como os milhões de consumidores de drogas no mundo são masoquistas, não é mesmo?

Será que o assunto não é um pouco mais complexo?

A idéia de que a mídia tem uma função social e didática, que é o quarto poder, fez com que perdêssemos qualquer capacidade de análise. Adeus às sutilezas.

E o mundo fica a cada dia mais chato, monótono, equacionado, enquadrado.

Pior é que quando olhamos as pessoas a nosso redor, as pessoas de carne e osso, cheias de dúvidas e inseguranças, pulsos e reflexos contraditórios, quando olhamos para nós mesmos, com os olhos de dentro, nós é que parecemos personagens de ficção. E, no cinema, na novela é que temos as pessoas de verdade. Na propaganda é que tem gente de verdade.

Para dar um passo além do riscado, tabulado, pesquisado, “Ai, meu Deus, que medo!”. Parece que sabemos tudo do consumidor. Sabemos que ele sempre pensa ou branco ou preto, ou sim ou não. Não existe cinza nem talvez.

E, se as pesquisas pensam pela média, o marketing também pensa pela média, e a propaganda faz propaganda média. Só que a média entre 10 e 0 é 5. A média entre 2 e 8 é 5. A média entre 5 e 5 é 5. Sacaram?

O credo fanático pela pesquisa transforma os consumidores nos clones de Boba Fett, do “Star Wars”.

Uma pessoa de comunicação devia ter em seu currículo mais Fla X Flu e menos Kotler, mais David Lean, Orson Wells, Bergman, Woody Allen, Almodóvar e menos reunião de integração, mais literatura, filosofia, psicologia e menos grupos de pesquisa.

Quem sabe, assim, um dia, a propaganda volte a falar com gente de verdade e não com um bando de robôs binários.

Essa coisa da TV Interativa.

Agora resolvi quicar sobre a coluna do Zimbemberg de terça-feira passada.

Ele fala da tal ameaça proporcionada pelos tais aparelhinhos (TiVo) capazes de castrar a programação das TVs abertas de seus comerciais e de uma tosca tentativa de novo formato de publicidade inspirado na ainda mais primitiva idéia do pop-up nos sites comerciais.

O problema central, no entanto, não me parece ser o desafio de criar novos formatos publicitários. O verdadeiro embate se trava na qualidade do conteúdo publicitário.

Devemos entender, de uma vez por todas, que a publicidade não é mais apenas um espaço para vender as incríveis qualidades dos produtos que ela serve.

Essas ameaças que por vezes pairam sobre a indústria têm lá seu valor, que é de discutir, reabrir o debate e, obviamente, avançar. A publicidade sem dúvida mudou e ainda vai mudar muito. Pois, de fato, o consumidor tem tolerância zero para a propaganda chata, mentirosa, falsa, careta. O consumidor não tem mais saco para a mulher Palmolive, aquela que não acorda amassada, não solta gases, não quebra a unha, nem menstrua. O consumidor não suporta mais garotos-propaganda berrando promoções, atores de novela fingindo a  compra de cozinhas vagabundas, nem demos de produtos. No entanto, consumidores vibram e comentam comerciais engraçados ou emocionantes, produções caprichadas, roteiros com pé e cabeça, trilhas, fotografia, efeitos especiais. Gostam de histórias de verdade. Aplaudem e vibram com idéias. A propaganda não precisa reinventar seus formatos. Propaganda é conteúdo, e, de conteúdo, o consumidor gosta. Propaganda só é um mal necessário, quando ela é ruim. A ameaça, portanto, que paira sobre essa indústria é a ameaça da má propaganda. Essa é muito mais perigosa do que o aparelinho que capa os comerciais.

Em segundo lugar, a publicidade é o motor da mídia. Sem publicidade não há mídia, não há informação, não há conteúdo. Logo, antes mesmo de pensar em dispensar o motor, vamos pensar em formas alternativas de propulsar a indústria da informação. A grande revolução do século passado consiste no acesso livre e gratuito à informação. Taí a Internet para dar uma idéia do que isso significa: a mais formidável mudança de sociedade de que se tem notícia. Significa também a verdadeira esperança positivista de acesso democrático à cultura e à educação. Isso tudo tem um custo, claro, e quem paga é você, consumidor, numa extraordinária, intangível e mágica ferramenta de transferência de riqueza. Todos conhecemos os discursos inflamados que alimentam os debates sobre o viés da publicidade. Mas os 60 bilhões de dólares investidos em publicidade no mundo financiam a Dona Maria que faz telecurso no Maranhão, o Seu Joaquim que refresca a cuca na novela das oito e o garotão que dá risada com as macacadas do Casseta e Planeta. Quem quer abrir a mão disso levante a mão. Eu não quero. E podem me chamar de cínico.

A mídia que todo mundo vê e ninguém olha.

Têm coisas que são estranhas mesmo: jogador de futebol fingindo uma contusão cada vez que perde a bola por falta de perícia, lavar a mão depois (e não antes) de fazer xixi e ser “heavy user” de Internet e programar apenas 1% da verba para essa mídia.

Sempre me soou estranho ver as pessoas usarem a Internet freneticamente mas desprezarem a mídia na hora de decidir investir em publicidade on-line.

Daí, penso assim: é, mas essas pessoas não consomem carros, celular, serviços bancários, cerveja. Não, não, isso é absurdo demais.

Então vai ver que é outra coisa. Vai ver que quem consome computador, eletrodoméstico e faz compras no supermercado é que não usa Internet e muito menos trabalha com marketing. Meio absurdo também.

E se fosse por aquele argumento meio empoeirado: somos um país de mortos de fome, de sub-desenvolvidos, um país de coitadinhos? Não é absurdo mas é mentira.

Daí fomos olhar uma pesquisa e encontrei a verdadeira razão.

Mas vamos aos dados extraídos do TGI Ibope – primeira onda 2002. Não quero exaurir a questão nessa análise preliminar. Mas dá pra ter um cheiro.

Perguntamos aos entrevistados “Como você ocupa seu tempo durante o dia? Neste diário você deverá descrever a maneira como se comportou ontem, respondendo para cada intervalo de 30 minutos: onde você estava, se estava acompanhado e o que estava fazendo”.

O target é de Jovens AB de 12 a 24 anos nos seguintes sub targets: posse de automóvel, celular, internet em casa, computador, TV, utiliza serviços bancários, consumiu cerveja nos últimos 7 dias e fez compras em loja de departamentos nos últimos 30 dias.

O resultado é surpreendentemente parecido: cerca de 20% do target respondeu que usou Internet no dia anterior à pergunta.

Mais surpreendente ainda é que o alcance de Internet ganha de TV por assinatura, jornal, revista e cinema em todos os sub-targets. Ganha sempre.

A mais singela das conclusões que podemos tirar é que, entre as atividades realizadas no dia anterior, os jovens AB de 12 a 24 anos, nas 11 praças pesquisadas, consomem mais internet que algumas mídias tradicionais. Mídias essas que, inclusive e “en passant”, concentram volumes de investimentos maiores até mesmo para produtos e serviços cujo target de mídia é esse mesmo público.

Mas por que será então que se investe tão pouco em mídia on-line?

Eu havia prometido uma resposta a isso?

Ah, sei lá. Vai entender também por que é que tem gente que faz bolinha com catota do nariz, morde a gola da camisa e limpa a orelha com o dedo mindinho?

A hipocrisia da mídia.

Se buscamos audiência, muita audiência, audiência maciça, procuramos conteúdos universais ou que provoquem estímulos básicos. Conteúdos “mínimo denominador comum”. Humor, emoção, beleza, violência são recursos inevitáveis para atrair audiência. Não tem muito como fugir desses apelos que são a matéria prima da mídia, e da propaganda, por extensão. Mas é claro que não citei o mais comum dos denominadores. O mais vital. O mais subterrâneo e por conseqüência o mais discriminado: o sexo, adivinharam. Ou melhor qualificando, os apelos de natureza sexual, eróticos ou pornográficos.

Ninguém é inocente aqui, muito menos a mídia. Muito menos a audiência. Mas sem querer lançar-se em análises psicológicas, é evidente que esses apelos nos cercam (e deleitam) na mídia, por vezes de maneira velada, – e para isso usamos o pleonasmo de “erotismo”, – por vezes de forma explícita – e nesse caso não temos medo de falar em “pornografia”. A fronteira é tênue e muito pessoal.

A inocência sexual é um tabu difícil de cercar. Falamos em degenerescência de costumes ou mais simploriamente da perversão dos valores.

Imediatamente nos preocupamos com nossas crianças. É o alibi que precisamos para nos comprar uma boa consciência.

Mas esse argumento é assustador. Autorizamos a violência, a superficialidade, a mentira, o pastiche, a manipulação, a mediocridade na mídia. Tudo isso pode. Sexo? “Bem, sei não, cuidado, isso é perigoso”.

O que é mais permissivo? Uma cena de amor ou o bisbilhotar indecente do ócio vulgar dos reality shows? Uma insinuação sexual ou uma cena de violência sanguinolenta? Uma bunda gostosa ou um erro de português?

Na Internet, é notório que os sites de maior audiência são os de conteúdo erótico ou pornográfico. Incomparavelmente maior que qualquer outro. Maior e mais barato. Incomparavelmente também.

Daí, parei para pensar. Porque será que não podemos anunciar nesses sites?

Curiosa hipocrisia.

A mídia em uníssono.

Assisti como todo o mundo ao ataque terrorista nos Estados Unidos, pela TV. Estranhamente não fiquei chocado. Era como se minha retina estivesse cheia de vaselina. Meu olhar deslizou por aquele espetáculo. Nada muito além de mais uma super produção esmerada. Abduzido pela força daquelas imagens, confesso que fiquei desapontado no final: “mas foi só isso?”.

Com o tempo, no entanto, aquele pastiche da mídia foi se esgarçando. Com o tempo, foi me dando um estranho nó nas tripas. Meu coração disparava cada vez que acessava algum site de notícia, web afora. Me arrepiei tantas vezes. Chorei outras. E a cada hora que passa, o nó aumenta. O atentado é hoje mais grave do que foi ontem e menos do que será amanhã.

Estou com muito medo do futuro. Pior, estou com muito medo daquilo que pode estar acontecendo agora, neste momento. Medo daquilo que a mídia não fala.

Também tenho medo desse refrãozinho “bem pensante” que ecoa aqui e ali: “é chegada a hora do mundo ocidental olhar com tolerância e imparcialidade os problemas do mundo”. De que servem estas palavras além de tentar nos construir uma boa consciência de festim?

Tenho muito medo da combinação diabólica “ódio e patriotismo”. Tenho medo ainda das palavras vingança, da palavra culpado. Medo da fórmula “recuperar a auto estima”.

Medo da mídia e sua capacidade de equacionar insidiosamente problemas.

Este texto, lamentavelmente não tem conclusão. Esse texto, infelizmente, não sugere soluções. É só uma ingênua manifestação crítica.

Eu só queria que fossemos vigilantes, muito vigilantes.

Porque a pior das armas, a pior das bombas, a pior das chagas talvez seja a unanimidade.

A mídia de massa e o jovem.

Sabe aquele discurso pseudo engajado que credita a favor de mídia de massa uma manipulação opressora da sociedade, um poder nefasto a serviço de uma elite com interesses espoliantes e uma influência lobotomizante nos jovens?

Sempre desconfiei um pouco desse raciocínio. Primeiro porque pertenço 200% à geração TV e não me considero nem mais nem menos manipulado, oprimido, espoliado ou lobotomizado. Segundo porque qualquer raciocínio simplista me incomoda por definição.

Quem de perto já se envolveu com a mídia de massa, seja do lado de quem produz conteúdo editorial, seja do lado do conteúdo publicitário, sabe que esse raciocínio além de ingênuo é absolutamente falacioso.

Basta analisar a gênese verdadeira da histérica briga pela audiência e seu corolário, o nível cada vez mais “minimo denominador comum” para não dizer “baixo” dos conteúdos. Quem vê nisso uma lógica de opressão disfarçada vive num gibi do tio patinhas e não no século XXI.

A equação é cristalina, querem ver?

A mídia produz conteúdo. Esta produção é financiada pelos anunciantes que na carona do interesse dos consumidores por esses conteúdos, comunicam seus produtos e marcas com um compromisso ético de confundi-los o mínimo possível. É uma grande invenção esse negócio e bom para todos.

Não existe invenção que não traga na sua gênese seu complemento destruidor. Inventaram a estrada de ferro. Com ela, o acidente de trens. Inventaram o carro e com ele o trânsito. Inventaram as balas de goma e com ele os dentistas. Solução e dis-solução são primas xipófagas.

Pois bem vejamos. Para aumentar e sempre aumentar a audiência só existe uma fórmula, a saber, perseguir um conteúdo vulgar que atinja o interesse “mínimo denominador comum” do público. Buscar audiência na mídia de massa é uma espiral com data marcada para o acidente fatal: o dia em que estivermos tangenciando a audiência “máxima”. Parece que estamos bem perto desse momento.

Para alcançar cada vez mais pessoas, somos obrigados a dar tratos a bola para criar um conteúdo “novo”, “original” e, terrível sina, “universal”.

Mas num determinado ponto dessa fuga para o acidente fatal, as pessoas começam a desistir do trem, andar de bicicleta e comer menos doce. Num determinado momento, começamos a evitar a mídia de massa. Este momento é exatamente aquele ponto de inflexão que precede e provoca o acidente ao mesmo tempo. Quando o conteúdo de tão mínimo, de tão comum, de tão vulgar, não mais nos interessa. Daí começa um vazamento aqui, os formadores de opinião, um vazamento ali, a elite, um vazamento acolá, o jovem. E pronto.

Isto posto, vamos falar um pouco da Web que, apesar da dor de barriga, continua cada vez maior, mais diversificada e criativa. Pois eu quero falar precisamente dessa dor de barriga. Se acessarmos qualquer um dos grandes concentradores de audiência da Internet com olhar crítico, damos de cara com ela. Uma promiscuidade porca de conteúdos. Isso para não falar do assalto indecente que mistura o mais nojento dos varejos com um sensacionalismo oportunista. Uma página inicial mínima, comum e vulgar. Opa, já vi esse filme.

Mas não é lógico isso? Essa Internet dos portais é uma Internet morta. Uma Internet movida aos dólares da especulação financeira. Uma Internet que se justificava através dos únicos argumentos que o dinheiro entendia: audiência, audiência, audiência. Uma Internet mídia de massa. Está escrito na primeira página dos maiores portais do mundo: a Internet mínimo denominador comum é um fracasso. Está lá, escrito na primeira página dos maiores portais do mundo: nosso modelo morreu.

Os precipitados dirão: “claro, a Internet é uma mídia segmentada”. Alto lá. Essa Internet segmentada veio antes. A Internet dos criadores de gatos persas é igualmente um modelo morto.

Mas qual será o modelo então? Não sei. Não sei. Mas tenho uma terrível intuição. A intuição de que talvez simplesmente não haja modelo. E se não há modelo, não há solução. E se não há solução não há dis-solução. Faz sentido?

Internet: a briografia da imprensa.

Tenho ficado muito puto com a cobertura que uma certa imprensa faz da agora mal fadada nova economia.

Para aqueles que acham que vivem, rezam e comungam pela Internet desde criancinhas, até se esquecem que ainda era ontem e a Web ocupava uma coluninha obscura de certas revistas de tecnologia.

Daí, virou meio cult falar do assunto. Ele pipocou calmamente aqui e ali, nichadinho no material de leitura obrigatório de qualquer digerati, de qualquer moderno.

A grande imprensa, aquela de fácil digestão escrita por jornalistas fanáticos por suas jurássicas máquinas de escrever, não encontrava na Internet qualquer interesse. Até que de repente ouviram falar daquela mocinha que foi enganada por um sujeito tarado atrás de um computador. Opa, isso é legal. O povo gosta. E a Internet virou instantaneamente o hit das páginas policiais. Sites neozistas e de pedofilia que viviam no mais absoluto anonimato, vomitando suas obscenidades para meia dúzia de abjetos seres ganharam notoriedade. A Internet era o inimigo público número e uma onda de neo-ludistas ressurgiram das cinzas.

De repente, não se sabe ainda por qual conjuntura diabólica, o povo da grana passou a se interessar por essa possível fronteira. Talvez apenas e simplesmente porque sobrava demais. Então cagaram grana na cabeça daqueles pobre coitados que estavam começando, por convicção e paixão, uma atividade na grande rede. Dinheiro pacas. Um monturo. Instantaneamente, Internet virou assunto das páginas de economia e finanças até atingir as primeiras páginas dos jornais. Só se falava nisso e ficamos com o saco na lua de tanta espuma. Um horror.

E como não poderia deixar de ser, depois do inconsciente porre, vem a ressaca. Dor de cabeça, dor na alma. A grana ficou curta, curtíssima, sumiu. Quebradeira, demissões, etc e tal. Pronto, da primeira página diretamente para a de Falências e Concordatas. É óbvio que por conta de uma diabólica reciprocidade, o espaço tinha que ser proporcional ao anteriormente ocupado. Saco, de novo.

Mas o que resta de tudo isso? O que restará daqui a 10, 20, 30 anos? O mesmo que aquele famoso e disputado bal masqué que a Imperatriz Leopoldina deu no Palácio em mil oitocentos e bolinha e que foi noticiado com fervor quase religioso pela imprensa. Vocês não lembram? Nem eu. Não tem a menor importância nem relevância. Tudo faits divers. Conteúdo efêmero, supérfluo, pra encher linguiça.

Fico então me perguntando, e agora, o que vai acontecer? Pra onde mais uma vez irá migrar o assunto Internet e que tais? Muitos desejam raivosamente um expresso da página de Falências e concordatas diretamente para o obituário. Tragédia vende papel.

Mas nada disso importa muito não é mesmo? Faça uma análise consciente, clara, fria, lúcida. A Internet é ou não é do caraio? É sim. Isto sim é que importa.

O resto são palavras impressas no embrulho do cocô do meu cachorro.

A imprensa cyborg.

É noite na campina. Bafo quente e aquele silêncio. Medo dessa escuridão toda. Medo de quê? Medo de ver o que não se quer ver. Mas, se não se pode ver, tal a escuridão, qual é o medo? Olhos cerrados não vêem e tampouco dão medo. Mas esse pensar dá mais medo ainda. Deixa pra lá.

Eis que sobe da ravina um, dois, três, muitos zumbidos. Mais medo. Medo de ouvir sem ver. Mas por quê? Deixa pra lá. E de repente a campina acende fugaz. Um casebre pisca e apaga. Uma moita. Pisca e apaga. A estrada e o casebre. Piscam e apagam. A ravina e a moita. Piscam e apagam. O casebre, a estrada, a moita e eu. Piscamos e apagamos. E o medo? O medo também, apaga e pisca. Meu medo a mercê das bundas fluorescentes dos vagalumes.

E é dessas luzes fugidias que insistimos em retratar nosso ambiente, nossa história. Como se o piscar fosse capaz de descrever todo o horizonte, as nuvens, o campo, o ritmo do andar, o pulso do vento, o medo.

Certa imprensa, a grande imprensa, a imprensa de massa trabalha assim, iluminando aqui e ali. Fatos, acontecimentos, personagens. Números e mais números. E vamos nos norteando nestes clarões. Quase às apalpadelas.

Assim, quando esta imprensa ilumina o casebre e a estrada, está ocultando o precipício que está diante dos meus pés. Quando ela está acendendo a moita, não ilumina a tempestade que ocupa todo o céu.

Pois ela não sabe fazer história. Tão somente documenta-a com seus fragmentos factuais, pequenos clarões em um todo vago e confuso.

Tampouco sabe contar estórias. A pressa é tanta, a urgência do furo é tal, que o estilo escorrega. Fatos e números não apaixonam.

Então, o que tristemente lemos e vemos por aí é uma imprensa monossilábica, almanaque. O leitor, contaminado, tem sua atenção e capacidade de pensar adormecida. E quanto mais adormecido está, mais permeável. Daí, é fácil fazer malabarismos e prestidigitação com o seu senso crítico. Afinal de contas, números não se discutem. Mas números são apenas vagalumes.

E agora, neste mundo que aposentou o mitológico em favor do bitológico, neste mundo que vive no limite do tempo e do espaço, estes pequenos clarões não são mais capazes de aplacar o medo do escuro. E na correria do fechamento, agora medido em minutos e não mais em dias, aleija-se a análise, avacalha-se o estilo. E com isso, perde-se a capacidade de entender, e o prazer de sentir, o todo.

Notícia, furo, dados, pesquisas, personagens. Commodities em liquidação. Na Internet notícia não vale nada porque não tem autor. Na Internet furo não existe porque todos chupam. Na Internet, dados não têm peso porquê não são exclusivos.

A imprensa tradicional não está ameaçada pela membrana digital porque os veículos físicos são obsoletos. Ela está ameaçada porque está perdendo a capacidade de expressar o todo. Está ameaçada porque o repórter, o jornalista, o editor está num processo compulsivo de autocastração. Eles se cobram daquilo que não tem mais valor. Capam-se da intuição, da crítica, da análise.

Quais seriam os papeis da mídia digital e da física neste novo cenário? Com quem ficaria a análise e quem se ocuparia dos fatos? Mas sequer vemos essa preocupação atravessar a grande imprensa. Tampouco na Internet. Está tudo igual. Fatos, fatos e fatos.

Acho que trocaram o nervo ótico pelo microscópio.

Em um mundo altamente técnico e científico, ganha seus títulos de nobreza aquele que for capaz de quantificar. E isso para todos e tudo. Números e estatísticas. Mas qual é a essência da imprensa? Afinal de contas, com o que ela lida? Com a observação, com a criação, com a inteligência muito antes do vômito de números e estatísticas. Observar, escrever e falar virou ciência exata agora?

E daí meu medo. Meu medo de ver um todo que pisca timidamente, iluminado ao bel prazer e racionalidade de vagalumes . Lumes vagos.

O Yin e o Yan dos meios.

As vezes me preocupa um pouco aquele discurso que já virou lugar comum: a mídia Internet é interativa e a TV é passiva. Essa afirmação é óbvia mas nem sempre nos perguntamos o porque da diferença. Preferimos aceitar essa máxima como dogma.

Mas queria sugerir alguns pontos que longe de procurar respostas pretende tão somente acordar o debate.

O ambiente: passividade, interatividade ou atividade on demand?

Interatividade na minha concepção significa “ação com participação”. Em outras palavras, é uma ação do agente com participação inteligente do objeto. Interatividade significa no limite que não há objeto, apenas agentes. Gosto da metáfora do vírus. Sem portador, ele não tem vida. É quase um mineral. No entanto, quando encontra um agente, passa a ter vida, reproduzir-se da interação com o agente. E aqui, cabe definir a fronteira entre o que é interatividade e on-demand. Definitivamente, os dois conceitos são distintos. On-demand é a TV. Eu clico, ela acende. Eu zapeio, ela troca de canal. Ou, on-demand é a maioria ainda do que se vê na Web hoje. Clico num hipertexto, ele me dá a matéria que pedi. Só isso.

Já interatividade sugere que há inteligência do lado de lá da interface, seja ela uma inteligência pré programada como em um game, seja ela humana como em um chat. O exemplo máximo de interatividade que podemos imaginar hoje são experiências de imersão na interface.

A Web é muito útil pois ela automatiza e multiplica a capacidade de entrega on-demand de conteúdos. Mas a Web só é revolucionária quando consegue ser interativa, coisa que jamais a TV ou as outras mídias passivas podem ou poderão ser.

Os agentes: espectadores ou expectadores?

Em uma mídia passiva não temos usuários, temos espectadores, ou seja pessoas que assistem. Está caracterizada, através do público a vocação das ditas mídias passivas: ele não quer nada, ele assiste. O querer, a gente pesquisa, mas não mudamos on demand. Os programas “interativos” da TV, os “você decide” são o máximo de interatividade que se pode alcançar nessa mídia. Assim mesmo, o que vemos é uma simulação de participação, uma vez que a saída é sempre escolher pela maioria das respostas e não dar a resposta que pedi e quero. A eterna lógica do mínimo denominador comum, pensamento chave das mídias de massa, novamente abafa qualquer tentativa de tornar interativa a mídia.

Já na mídia dita interativa, não temos espectadores e sim expectadores ou seja pessoas que esperam. Aqui, igualmente, está sacrementado o objetivo máximo e ideal dessas mídias para o público: ele quer escolher (on-demand) e idealmentemente interagir.

A Web é extremamente competente para atender expectadores e ainda muito primária para espectadores. Espectadores procuram emoção, sensação, pulsos inconscientes. Na Web isso ainda é tecnologicamente impossível. No entanto, na mídia passiva, expectadores são e serão sempre frustrados. Aí está o nicho da Web que ainda devemos aprender a explorar.

Tendência: de que convergência estamos falando?

Durante décadas, a mídia passiva reinou soberana. Eis que surge um obstáculo dialético: a Internet. E agora falam em convergência. Convergência de quê? Dos devices, dos meios de transmissão, concordo, vamos nessa. Mas convergência dos conceitos não. Não ainda. Cabe-nos entender ainda que somos seres passivos, absorventes, negativos tanto quanto ativos, expansivos, positivos.

A mídia deve ser igualmente passiva e ativa, fêmea e macho, sol e lua, Yin e Yan.