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Ninguém segura os babuínos

Quando o ser humano era nômade e vagava desorientado em busca de alimentos pelas terras ermas, o sexo não existia e muito menos a monogamia. O ato sexual, ainda que é provável que já fosse gostoso, era um reflexo aleatório que garantia a perpetuação do rebanho. Quem já viu um grupo de babuíno solto, trepando como respira com quem aparecer na frente, tem uma boa imagem dos hábitos reprodutivos dos nossos ancestrais.

Alguns infelizes resolveram fixar-se à terra, plantar, construir habitações duráveis. Era economicamente mais interessante e principalmente era menos cansativo. A preguiça é uma qualidade atávica da espécie. Não sair do lugar também significava conviver sempre com os mesmos objetos sexuais. A variedade incidental, descompromissada, leve e livre deu lugar a experiências mais comedidas, restritas e monogâmicas. De vez em quando, os babuínos que nos habitam soltavam a franga, mas eram reprimidos.

Depois veio o casamento, o amor, o amor romântico e tudo que já conhecemos, até que a morte, a traição ou o divórcio nos separe.

Hoje é assim: em 10 minutos a gente encontra um parceiro, em 10 a gente se encontra, em 10 a gente trepa e em 10 a gente swipa para outro.

Os babuínos se soltaram dentro de nós.

Cinismos à parte, o que será feito dos relacionamentos em uma selva tão abundante e promíscua?

Pois talvez, talvez, uma coisa será uma coisa, outra coisa será outra coisa. Relacionamento será uma coisa, sexo será outra coisa. Trepar será uma coisa, às vezes em relacionamento, outras sem, e tudo ficará bem.

Enquanto isso não acontece, boom-boom-boom, swipe.

Você é jovem? Depende de quantos amigos tem

Saint Exupéry, em Terra dos Homens, dizia que só existe um luxo verdadeiro, o das relações humanas. Ele devia ter meia dúzia.

Júlio tem 132 amigos. Luxo total. Devidamente ativos no msn, eles estão sempre a um toque de um Olá, Hey, Slt, porque, claro, eles estão espalhados nos quatro cantos. A maioria deles viu a luz nas redes sociais que Júlio freqüenta, tab sobre tab e no celular. Somando o povo todo, os amigos do msn e os amigos das redes, somam 645. Se Júlio fica acordado 14 horas por dia, e considerando q ele se comunica com o povo a cada dois dias por 3 minutos, somando os 1000 torpedos do seu pacote de celular que ele esgota todos os meses, Júlio está, o tempo todo, sem parar, se relacionando. Desconfio que Júlio faz xixi nas calças, por absoluta falta de tempo.

Urge o tempo de redefinirmos a palavra que está mais na moda no mundo: relacionamento. Amigo é coisa para se guardar em intangíveis bits.

Mas amigos, mesmo esses para os quais não dedicamos mais de 3 minutos a cada dois dias, fazem perguntas, esperam respostas, reações. Então, o jeito é ir ao sabor dos impulsos, transparentes por definição, sem pesar as palavras. A gente vai chutando as coisas, interpretando nossos relacionamentos na superfície das sensações e sem muito medo, inclusive, de mandar mensagens para as pessoas erradas ou tornar público o que poderia ser considerado intimo.

Nesse mundo fragmentado, que consumimos com crises infinitas de soluços, somos homens cebolas também nas relações. É a única proteção, inconsciente, que nos salva. A solidão é uma impossibilidade, a reflexão e a contemplação também.

Para cenaristas mais pessimistas, é o fim da individualidade. Para os mais positivos, é a re-união da espécie.

Júlio não acha nada ruim tudo isso. Não é massacrante ter que lidar com tanta gente. Anormal é perder tempo sem fazer nada. E quando a Internet cai, ele vai dormir: vai fazer o quê?