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Os da camiseta preta

Talvez o mundo esteja ficando menos inocente ou o dilúvio de informações e a instantaneidade do acesso a elas ocupou o lugar da fantasia e da intuição; quem sabe também, os consumidores tenham menos paciência com as manipulações publicitárias; ou a indústria da propaganda acreditou demais no seu poder, olhou demais para o próprio umbigo e colecionou medalhas ao invés de propósito, mas porque a propaganda está tão básica e covarde?

Ironizamos os professores que ensinam porque não sabem fazer, reclamamos dos intelectuais sem calo na mão ou dos políticos que usam a retórica para justificar a representatividade, criticamos os técnicos de futebol e também o pessoal do marketing que exige e cobra mas é ruim de bola.

Mas nunca nos perguntamos porque o produto final do trabalho está tão repetitivo e se não teria alguma responsabilidade a assumir.

A culpa é dos camiseta preta.

Que transformaram suas recomendações estratégicas em dogmas esotéricos que cumprem muito bem a função de dar um álibi intelectual ao trabalho maçante de vender pasta de dente mas muito pouco a servir de insumo criativo.

Que acreditaram numa visão entrópica do trabalho de posicionamento de uma marca, justificando a mensagem pela mensagem ao invés de encaminhar um problema de negócio.

Que mistificaram tanto sua pretensa superioridade intelectual que, em tempos de crise e da ditadura da performance, provocaram uma onda reacionária mas segura das mensagens, mais pragmática e sem graça.

No front, estrategistas são bucha de canhão.

Propaganda: estratégia pra quê?

Até muito pouco tempo atrás, não se concebia dar um passo nos negócios se ele não estivesse inserido em uma estratégia, com começo meio e fim e fundamentada em uma visão de longo prazo. A visão, uma espécie de pitonisa, antecipava o futuro construído sobre valores sagrados. A estratégia era uma profecia revelada ao cabo de muita reflexão e experimentação. Era um assunto sério.

Mas não há nada mais fora de moda do que estratégia. É quase uma palavra esnobe, pronunciada por poetas que flutuam em nuvens conceituais. Desenhar estratégias é sonhar com o impossível e faltar com o pragmatismo necessário para realizar.

É mais ou menos como a diferença entre ciência e tecnologia. A ciência projeta leis teóricas que muitas vezes carecem de comprovação experimental mas orientam, conduzem e preparam o progresso da vida humana. Ciência é estratégia. A tecnologia, por oposição, é uma série de táticas práticas a serviço do mercado. A ciência pensa no futuro, a tecnologia pensa no presente. A ciência antecipa, a tecnologia aplica. O Vale do Silício não investe em ciência, nunca investiu. Investe em tecnologia. Ele não está a serviço do progresso do homem first (outra palavra fora de moda) mas a serviço do crescimento dos negócios only.

Descendo do Olimpo, para o mundo subterrâneo da propaganda e do marketing, pensar estratégias para as marcas é não somente desprezado como inútil. Os consumidores que orientam as decisões também não projetam mais suas vidas estrategicamente. Todo mundo vive o momento, fugaz, na velocidade de um scroll, de um swipe. A atenção é tão fragmentada e dispersa, que não sobrou tempo para o tempo. Então de que serve conceber e seguir estratégias que projetam o comportamento do consumidor se ele age apenas em função dos estímulos do momento? Todos os dias nascemos, vivemos e morremos. Apesar da cronologia do timeline, é a postagem daquele instante, respondendo a algoritmos que não controlamos (portanto aleatória ou manipuladora) que ritma a vida.

A boa prática do marketing de hoje é não inferir nem antecipar. A boa prática é testar e medir, testar e medir. Um olho no BI e outro no gatilho, atirando mais rápido do que a sombra. A boa prática da propaganda não suporta mais cronogramas e briefings. A boa prática é fazer e subir, já.