Com que roupa eu vou?

Talvez apenas porque a escolha tivesse sido tímida ou inocente, mas Caio não estava satisfeito. Voltou para o quarto para uma nova tentativa. Tinha que ser com aquela calça, novinha e cara. Afinal de contas, ela originara a excepcional mudança de aparência requerida. Mas a camisa cinza acinturada dava-lhe ares de aprumo exagerado. O sapato, embora adequado para o clima, era uma repetição que certamente seria notada.

Escarafunchando na pilha de camisetas, Caio foi jogando algumas eleitas na cama, seguindo motivações ora de aparência, ora de afeto ou de combinação. E, de frente para o espelho, experimentou todas. Mas algumas mostraram-se alegres demais, apertadas ou soltas, outras apresentavam um caimento triste, uma estampa cheia de subentendidos ou simplesmente uma dobra feia nas costas, um ombro deslocado, uma gola amarfanhada. Sobraram três que lhe pareciam adequadas, embora apenas uma delas refletia seu estado de espírito blasé chic, ou melhor, o jeito como ele queria parecer naquele dia.

Caio tentou por cima da calça, mas o comprimento era estranho. Ele ensaiou uns movimentos, mas ele não tinha engordado, ele tinha certeza. Só podia ser a camiseta, que ele tratou de enfiar por dentro da cintura. Melhorou muito, porém era arrumado demais. Ia ficar evidente que ele passara horas se enfeitando, e isso não combinava com o humor distraído, metafórico, poético que ele queria se impor. Puxou então os lados, encostando a gola no pescoço e soltando ligeiramente alguns centímetros de dentro da calça. O resultado agradou-lhe, principalmente sob alguns ângulos que ele trataria de privilegiar no decorrer do dia, enfatizando sua indolência aparente.

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