Atrasada

Acocorada à margem, ela arremessava pedras chatas no rio. Elas ricocheteavam uma, duas, vitória!, três vezes antes de serem engolidas.

Mas o que Sofia não sabia era que lá embaixo a turma de tilápias e acarás jogava beisebol com seu passatempo. O jogo foi duro, longo e terminou empatado, pau a pau.

Mais tarde, já muito atrasada na hora de voltar para casa, a menina não resistia e trepava na amoreira da praça. E com maestria ela tingia os dedinhos.

Só que Sofia nem desconfiava que, do alto, o sabiá desafinava quando avistava o topete loiro por cima da cerca. Em sincronia, então, as frutas riam de encher as bochechas de sangue.

A camisa de Sofia ficava toda salpicada. “Mancha de amora trai a demora”, rimava a canção. Mas a menina desajeitada antes piorava a evidência na pia.

Daí, o sapo ficava bêbado com as gotas doces que aspergiam a moita. E de alegria, saía em pula-pula até a cozinha, para confraternizar com Max. O gato levava um susto e corria  em disparada, escorregando no mármore.

Sofia sempre estava atrasada para o almoço. Ia ter bronca. E que bronca com a blusa assim!

Foi, então, que Max deu o alarme na casa. Deslizando a pança enorme, ele entalou debaixo do armário. E todos vieram ver a arte. Até o pai levantou da poltrona, para salvar o animal.

Foi justo aí que Sofia entrou de ladinho, sem ninguém ver. Nem seu atraso, nem a blusa toda traída de primavera.

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