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O anonimato é um motor de perversão

Outro dia, promotores italianos solicitaram a prisão de diretores do Google, acusados sabe se lá de que, mas por causa de um vídeo publicado de uma criança com síndrome de Down sendo maltratada.

É evidente que não se pode responsabilizar o Google de nenhuma forma.

No entanto, um porta voz fez uma comparação no mínimo falaciosa, ensaiando uma defesa. Disse: “esse processo é igual a processar funcionários dos correios por cartas disseminando discursos de ódio. Tentar responsabilizar plataformas neutras por conteúdo divulgado nelas é um ataque direto a uma Internet livre e aberta e pode significar o fim da Web 2.0 na Itália”.

Não é igual, aliás, é completamente diferente.

Conteúdos na Internet são públicos (cartas não). E não somente são públicos como são livres, universais, passíveis de espalhafatação imediata, simples e gratuita. Isso muda tudo.

Muda porque não há fronteiras entre moral e liberdade. Não é liberdade publicar um vídeo de uma criança com síndrome de Down, é mal gosto e perversão. O motor da Internet é a liberdade, não a falta de ética.

Confunde-se demais anonimato com liberdade. O que permite que ocorrências como essas – e outras tão abjetas – aconteçam não é a plataforma livre e neutra do Google, não é tampouco os pulsos depravados da humanidade, é a máscara covarde do anonimato.

Liberdade, ao contrário, é poder assumir abertamente uma opinião, um ponto de vista, um partido, um desejo. É bater no peito e dizer “sim, fui eu”.

O tema do anonimato talvez seja o maior desafio a ser enfrentado e debatido nas plataformas digitais. Não a liberdade ou a censura. O Google não tem nada a ver com a história, mas o discurso maricas que se esconde atrás dos grandes conceitos de “liberdade de expressão” e “neutralidade” é fugir das responsabilidades de ser um motor sim, das mudanças extraordinárias que a Internet está trazendo, boas e péssimas.

Talvez a publicação do vídeo tenha sido a real motivação da violência. A perversão é mais excitante quando se torna pública e a Internet (o Google por exemplo) é perigosa quando promove e estimula indiscriminado anonimato.

Se os filhos da puta que publicaram esse vídeo não fossem anônimos, eles seriam punidos. E talvez a criança nunca tivesse sito maltratada.

O anonimato é falta de caráter, na Internet também

Semana passada, a policia anti-terrorista americana interpelou um ativista (e invadiu sua casa), sob a acusação de twittar para manifestantes da reunião do G-20. Aparentemente, o elemento estaria dando informações a respeito da movimentação da polícia (além de possuir uma foto do Lênin!).

O fait divers, que se soma a muitos outros usos do Twitter com finalidade pública ou politica (vide o Iran), levanta uma questão importante a respeito da liberdade e identidade das pessoas na Internet.

Em alguns países, o anonimato de um blogueiro é proibido. Em casos de crimes previstos em lei como difamação ou divulgação de conteúdos ilícitos na Internet, qualquer pessoa pode ser perseguida com quebra de sigilo autorizada.

Essa é uma das discussões que deve integrar o marco regulatório da Internet brasileira em breve.

A inocência do twitteiro americano é tão indiscutível quanto a culpa de muitas iniciativas ilegais que a aparente liberdade da Internet acoberta.

Como regular a Web?

De uma maneira geral, talvez baste seguir o exemplo da Inglaterra que simplesmente exige a identificação pública de qualquer autor. Ao invés de partir para ações criminais (como deseja, o senador tucano Eduardo Azeredo), medidas mais simples e civilizadas podem resolver.

A Internet é livre mas será que isso quer dizer que sua explosão depende do anonimato?

A liberdade é refém do anonimato?

O anonimato é precisamente o recurso que se usa para driblar possíveis coerções. Ladrões assaltam bancos com máscaras para não serem reconhecidos, terroristas idem e também vitimas de criminosos usam o anonimato para protegerem-se.

O anonimato não seria, ao contrário, uma espécie de covardia, assim como a falsidade ideológica? Desvios sérios de caráter? Na vida e na Internet também?

A liberdade, ao contrário é o corolário da coragem. Ser livre é não ter medo de pensar e agir. É não ter medo de assinar embaixo. É assumir opiniões e autorias. Na vida e na Internet também.