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O emergir do consumidor

É fato, no progresso econômico e, portanto, no conforto do sistema, a emergência de uma população ontem apartada. Muito se relaciona o ingresso de milhões de pessoas no mercado consumidor à rebarba da bonança econômica no qual o Brasil surfou e a certas políticas públicas – de assistencialismo para alguns, de justiça social para outros. O fato é que tais pessoas estão aí, e esse novo mercado interno pode significar um lampejo de esperança para um mundo atolado em recessão e desespero. Um novo mercado significa um novo Brasil para os milhões de sobreviventes de séculos de abandono.

Mário mora na periferia do Rio. Ele tem pouco mais de 20 anos e ganha trezentos e poucos reais com um emprego no supermercado. Mas uma coisa faz do garoto um cara diferente de seus pais, imigrantes nordestinos. Mário faz um bico vendendo DVDs piratas que ele mesmo confecciona. Dá pra tirar uns quinhentos por mês, dependendo da temporada de lançamentos. Mário também não dispensa o celular, o computador, o pen-drive pendurado no pescoço e está negociando um home theater para sua mãe (negociando, porque vai um pouco de dinheiro guardado, uma moto encostada e um pequeno empréstimo pessoal que ele conseguiu aprovar numa financeira). Mário faz sucesso e não deixa barato: capricha no visual, nas roupas da moda, perfume e produtos de beleza. Sabe tudo o que pega e o que rola.

Essa é a diferença: o desejo de consumo.

Então seria a tal da nova economia uma das novidades desse novo Brasil? Sempre houve informalidade no Brasil. Todo mundo sempre fez bico. A cauda longa é velha nossa conhecida. Só não tinha nome bonito nem frequentava dez entre cada dez congressos para bonitos executivos.

Mas vamos conversar com o Mário. O Mário tem internet faz tempo e também faz tempo que a Internet para Mário não é só uma grana a mais. Mário vai nos blogs, frequenta comunidades, se liga nas novidades. Sabe mais de tendências do que a maioria dos bacanas que aplaudem a cauda longa.

Informação universalizada, democraticamente distribuída não quer dizer apenas mais instrução e mais consciência. Não quer dizer apenas mais oportunidades econômicas. Também quer dizer mais desejo.

E o desejo é o reforço positivo indispensável para emergir da sobrevivência.

A Internet é um convento cheio de putas

No início, ninguém dava muita bola para o que saia na Internet, para o que se falava nos seus inescrutáveis meandros. Era uma molecada que brincava de ser jornalista, publicitário, comediante, cineasta.

A confusão está apenas começando.

A Internet é um megafone

Toda confusão começa com uma boa intenção. A boa intenção de falar a verdade, de ser franco, de ser uma bandeira de oprimidos, incompreendidos. Mas toda causa tem um efeito. Falar o que se quer e bem se entende sempre dá confusão. E falar num megafone como a Internet, mais ainda. E o que era apenas um suspiro de frente para o espelho vira um manifesto público multiplicado ao infinito e sem controle. A vida é assim – e não só na Internet: quem te apoia avisa. Quem não te apoia se vinga sem avisar.

Pra abrir o bico, tem que ter peito

Portanto, não adianta muito bancar o jovem imaculado descobrindo o mundo cruel, o artista inspirado no seu mundo cercado de virtualidades. O mundo não é um aquário cheio de peixes Nemo. Todo mundo tem ideias e, pior, interesses próprios. A inveja é a nossa gasolina. A Internet não é diferente de nada. Ainda que ela possa parecer livre de leis – e em larga medida é – não é livre de gentes, de pessoas. E pessoas podem ser muito mais repressoras do que a mais repressora das leis.

Quinze reais de fama

A imensa possibilidade de liberdade de expressão que a Internet proporciona está na raiz utópica do sucesso dos blogs e que tais. E, por detrás dessa sede de oratória e autoria, tem a vontade de ser visto. E, por detrás da vontade de ser visto, tem a fama e uns trocos.

Mas a confusão começa quando pingam os primeiros dinheiros. Ganhar dinheiro não é tão fácil quanto parece. Não basta dizer coisas inteligentes ou fazer macacadas. Se tem dinheiro envolvido, tem regras e leis e – queiramos ou não – elas devem ser seguidas. Podem espernear, fazer campanhas, mas pintou dinheiro, pintou confusão. Esse povo tão “liberal”, tão “paz e amor” vai se chatear.

Dinheiro e espontaneidade não ornam

E a maior confusão se arma então, quando tudo fica de pernas para o ar.

Os produtores de conteúdo, os da grande mídia, acham que essa “garotada da Internet” pode dar uma renovada. Aí a molecada vai para a grande mídia com aquela farta experiência dos seus blogs e views no YouTube. Se os brothers curtem, a Dona Maria vai curtir.

As agências de propaganda, sedentas de novidades, transferem a presumida liberdade de expressão da Web para a TV. Ao invés de comprar mídia, dá-se uma ajuda de custo àqueles que irão disseminar a mensagem. Uma espécie de suborno à legitimidade.

E as marcas, elas também, começam a achar que o que liga não é fazer propaganda, mas uma espécie de brand content ou qualquer outro anglicismo bacaninha. Tipo Merchandising 2.0

Os heróis dos blogs, porém, começam a ganhar dinheiro das marcas através de suas agências de propaganda. E o dinheiro estraga tudo.

Estraga o conteúdo, que por sua vez estraga a criação publicitária, que estraga a marca. E qualquer estrago é caro, mesmo que tenha custado três tostões.

As redes sociais e a democracia

Redes Sociais: duas entre cada dez palavras pronunciadas por qualquer bem pensante hoje em dia, em papos de “Abalar Bangu”. Mais um daqueles inúmeros fenômenos que surgem para acrescentar alguns charts às palestras dos gurus Best Sellers. Mais um tema para excitar os especuladores, os caçadores de talentos e os vendilhões de empresas.

Tudo nas novas plataformas de informação são reedições corrigidas e ampliadas. Os luditas e blasés adoram dizer isso. Portanto, para eles, redes sociais são espécies de “Rotary(s) Clubes” digitais.

Esse tipo de desmistificação é sempre um divertido argumento para brochar os excessivamente excitados mas é quase sempre um álibi intelectual para uma inépcia de entendimento das mudanças de comportamento que estão por detrás dessas “velhas novidades”.

Mas o que me interessa mais nos clubinhos virtuais é uma espécie de panacéia democrática que por ali grassa. Sem querer intelectualizar demais o papo, já é lugar comum dizer que a molecada tem um interesse muito passageiro, para não dizer inexistente, por política. A não ser em momentos de euforia ideológica, como a atualmente em curso no ringue das eleições norte-americanas, ela tem um desprezo absoluto por qualquer lógica majoritária.

É que de fato, essa coisa de submeter-se a qualquer decisão da “maioria”, é frustrante em tempos de liberdade de expressão absoluta e universal, de cauda longa, de morte do direito autoral e etc.

Em nossa democracia, é muito baixa a possibilidade de decidir e intervir. A única delas é o voto, pouco para um exército acostumado a clicar, a escolher tudo a toda hora.

É essa falência do “majoritário” que motiva e apaixona as redes sociais em todas as suas manifestações.

No limite, é como se estivéssemos encubando uma nova ordem mundial em que os humanos se agrupassem em torno de idéias compartilhadas, interesses ou polemicas comuns, gostos e simpatias antes de geografias, línguas e qualquer outro tipo de aglutinação física.

No limite, as redes sociais configuram os novos “Estados” que trocam o majoritário pela unanimidade. E não há “exclusividade” nem “limite” de “nacionalidades”. Pode-se pertencer ao quantos “países” quisermos, com múltiplas “identidades” até e “desertá-los” quando eles não mais interessarem ou outros mais atraentes surgirem.

Antes de tratar-se de uma utopia, a experiência da nova ordem e sua possibilidade virtual, vai corroendo todos os organismos e reinventando as relações sociais irremediavelmente.

A nossa crise, a internet e a propaganda

Está virando mania falar da crise. E manias são fenômenos retroalimentados: quanto mais a gente coça, mais coça. Quanto mais a gente come crise, mais ela nos come. Mas é irresistível e útil. Raramente uma crise foi tão fácil de explicar. As justificativas são irritantemente as mesmas e simples: excesso de liberalismo, crença na cura espontânea dos excessos, falta de transparência. E todo mundo tem culpa no cartório. Pois falemos um pouco da nossa crise: na propaganda.

A Internet é a plataforma do liberalismo absoluto, beirando a libertinagem. É algo geneticamente constituído para contornar e oferecer soluções rápidas e simples para subverter as estruturas de poder. E, ainda que organismos arcaicos (certos governos, instituições e empresas) tentem desesperadamente construir ferramentas de controle, elas são sempre humilhadas pela criatividade ou sucumbem às virtudes incontornáveis que a Internet tem também.

Mas a Internet não é nem boba, nem nada. Ela crê piamente na cura espontânea. Isso significa que a liberdade absoluta de expressão e ação, no limite, separa o joio do trigo, descarta o que não presta pelo sufrágio popular e conserva o que a unanimidade elege. Sua doutrina, “Se o povo quer, Deus quer”, é inequívoca. O laxismo corrige o achismo.

Poderíamos pensar, no entanto, que, por detrás das intricadas teias da Web, potencializadas por nossa infinita sede de aparecer e apoderar-se, somos todos os agentes trapaceiros e malandros que habitam esse templo obscuro. Mas a Internet vai na contramão desse vício sedutor. Ao contrário, ela é a mais transparente das nossas criações. O anonimato sucumbe e denúncias ganham proporções de avalanche num piscar de olhos.

A propaganda é, e sempre foi, uma espécie de ponte que conecta os dois lados do nosso sistema. De um lado, empresas que fazem coisas; de outro, pessoas que precisam dessas mesmas coisas. Para diferenciar umas coisas e outras e todas elas, criamos marcas que são uma espécie de representação das próprias. Essas marcas são os atores da propaganda.

Se as marcas simbolizam os produtos, elas também tentam sensibilizar as pessoas, valendo-se da exploração de suas aspirações, sonhos, esperanças, complexos, frustrações. É aí que a marca seduz e estimula a mágica química do sistema: faz-nos escolher e comprar. Essa é a alma do negócio que ela é.

Mas na ponte que conecta consumidores e empresas, existe um pedágio, pago pelos primeiros aos segundos, e esse pedágio se chama “marca”.

Essa taxação será tão mais importante e significativa quanto melhor for precisamente a propaganda que a veicular. Para ser melhor, a propaganda se utiliza de muitos recursos e, embora o debate aqui seja extenso, convenciona-se, quase unanimemente, que a boa propaganda é aquela capaz de suscitar-lhe emoções genuínas. Propaganda boa é aquela que diverte ao invés de aborrecer, que questiona ao invés de amortecer. Propaganda boa é aquela que diz a que veio, com clareza.

Quando a propaganda é boa, portanto, é como se o consumidor estivesse pagando um extra pela capacidade que ela teve de emocioná-lo.

A propaganda torna-se assim um “plus à gagner” (mais a ganhar) do produto e do consumidor.

Se a boa propaganda é um “plus à gagner” de mão dupla, no entanto, quando a propaganda é ruim, é como se o consumidor estivesse sendo potencial e inconscientemente extorquido.

O que seria uma propaganda ruim, portanto, nessa análise? Propaganda ruim é aquela que espertamente mascara o “plus”.

As formas mais clássicas são o entorpecimento e a insistência. Outras são requentar fórmulas. Ou ainda apelar para reputações alheias para referendar escolhas. Propaganda ruim pode ser simplesmente também aquela que apela para recursos pretensamente técnicos e demonstrativos para enaltecer vantagens racionais (precisamente função de outros recursos de comunicação como a própria internet).

A propaganda ruim cobra o pedágio mas não garante a viagem.

A Internet, como vimos, é a mais poderosa das armas para escancarar opiniões, potencializá-las. Está também se tornando a ferramenta por excelência de escolha por produtos. A internet é a plataforma decisória da pré-compra. E é lá também que o extorquido inconsciente abre os olhos ou pode abri-los.

É como se o pedágio fosse se tornando mais claro, mais transparente.

Esta crise é nossa. A crise da propaganda ruim, safada, opaca.

Internet: droga e ilusão

Desde que surgiram – ou se popularizaram – as novas tecnologias da informação e comunicação, e em particular a Internet, foram alvo de superexcitados debates.

Balbuciou-se, no início, sobre os efeitos nocivos que tão espetacular mudança poderia ter sobre éticas e costumes. A Internet estrelava um sem-número de “faits-divers”, atravancando retrancas policiais.

Arrastados por seu irresistível poder de sedução e uma incontornável necessidade, os editoriais afastaram-se da crítica factualmente supérflua e concentram-se hoje na revolução que se avoluma nos calcanhares dos sistemas tradicionais de produção e difusão de informação. Fala-se de adaptação, convergência, substituição, adjetivando os discursos com expressivas quantificações. Fala-se, com frenesi, da democratização do acesso à informação e ao conhecimento. Gargareja-se, com paradoxal inveja, da transformação do receptor em emissor e vice-versa. Do novo poder na mão de milhões de implacáveis editorialistas, capazes de destruir ou enaltecer reputações num piscar de cliques.

Pega mal, muito mal, falar mal da popularização da informação e do conhecimento agora disponíveis para quem quiser, num browsear de olhos. Pega mal, falar mal de “open source, “colaboração” ou “co-criação”, que está na genética da própria Internet e que agora aflora para a superfície.

Criticar a Wikipédia ou o Google (como sistema, e não marca) é um crime.

Negar o valor do jornalismo colaborativo, da informação e opinião difundidas aos borbotões em bilhões de sites, blogs, redes sociais e que tais é um genocídio.

No entanto, é hora de liberar-se do fetichismo tecnológico. É tempo de encarar alguns efeitos dos novos paradigmas, com olhar crítico ou ao menos compreensivo.

O quanto estamos substituindo a necessidade de aprender por uma simples possibilidade? Houve um tempo em que a condição para uma existência confortável era conhecer coisas “a priori”. Era como se o que se aprendia estivesse em compasso de espera para um aproveitamento futuro. Quando a necessidade surgisse, estaríamos prontos. Por isso, a gente passava um tempo danado pesquisando, decorando, aprendendo.

Agora, é mais fácil porque tudo está aí, muito barato e principalmente mastigado. É só entrar na Internet. Mas, se somos humanos, de tanto esperar, a gente acaba esquecendo que está esperando e que preguiça que dá! E, se somos humanos, dormir é muito mais gostoso do que processar e pensar.

Será também que não estamos dispensando a crítica pela intuição? A opinião embasada pelos discursos ejaculados precocemente? O quanto estamos preferindo a espontaneidade às idéias embasadas? Antes a gente era mais desconfiado, ficava cabreiro e ia atrás das fontes. Hoje, já que sabemos que somos agentes poderosíssimos de mudanças, sozinhos, “só eu com minha Internet”, por que quebrar a cabeça atrás de fatos e fontes? Mais do que nunca, agora, se dá melhor quem melhor e mais rápido se expressa, e não quem melhor pesquisa e pensa.

No limite, o acesso livre à informação pode ser um soporífero intelectual. No limite, a Internet pode ser a negação das verdades.

Decifra-me ou te devoro

Alguém tem dúvida de que o mundo está mudando numa velocidade inédita? Que estamos procriando demais? Que os recursos estão escasseando? Que jogamos fora quase tudo que consumimos e que não tem tanto lugar para tanta merda? E pior, que um reflexo condicionado nos faz acelerar ainda mais, procriar mais, destruir mais, consumir mais, cagar mais?

E esse reflexo tornou-se a base da pirâmide de necessidades do ser humano no século XXI. É ele que nos tira da cama todos os dias, nos faz olhar o mundo com retinas calcificadas, nos faz rir e chorar, esperar e sofrer.

Uma velha senhora me disse certa vez, quando me via aflito e estressado: “Seu problema é um problema que é?” Eu obviamente não entendi nada, porque esse vício que nos habita e nutre também faz isso com a gente: embrutece. Então, ela acrescentou: “Existem problemas que são problemas e há os que nós criamos. A gente tem que separar um do outro para só lutar pelos primeiros.”

E parece, parece, que nós criamos mais problemas do que encontramos. Nós. Porque mais ou menos quatro quintos dos outros seres humanos sobrevivem lutando contra aqueles que encontram.

Nós criamos muitos problemas e quase tudo que fazemos, além disso, é criar soluções para os problemas que criamos.

Inventamos os meios de comunicação, por exemplo, e não foi só para resolver nossa atávica solidão (um real problema), mas para reverberar nosso próprio discurso. Diante da aparente necessidade de falar para os outros, o que queremos é uma espécie de masturbação intelectual ou emocional. E como gostamos disso.

Inventamos a Internet, por exemplo. Não foi só para democratizar e fomentar o conhecimento (uma real necessidade), mas para gozarmos da nossa própria voz e ejacularmos nosso próprio poder.

Assim, passada a euforia e a propaganda excitada sobre as enormes mudanças de paradigmas, as colossais perspectivas e incomensuráveis esperanças que as plataformas digitais (incluindo a Internet) proporcionam, é hora de também considerar o que se esconde por detrás desse tesão.

Em larga medida, a gente está substituindo o aprendizado e o saber pela possibilidade do saber e do aprendizado. Antes eu precisava aprender para ser. Hoje, basta eu saber que eu posso saber quando eu precisar saber. Que é fácil, rápido, digerido e de graça. E esperando pelo gatilho da necessidade, a gente se distrai e afunda na preguiça.

Estamos também substituindo o olhar crítico, analisado, referenciado, pela opinião instintiva. Antes, para eu dizer e divulgar, eu precisava pesquisar. Hoje, basta eu escrever o que dá na veneta e sei que isso é uma bola-de-neve que se transforma em cataclismo, por força e obra de um incontrolável acaso.

Em tempos de enciclopédias livres, o conhecimento “a priori” é inútil. A memória é inútil. No limite, qualquer esforço intelectual é inútil.

Em tempos de jornalismo colaborativo, a opinião “com fonte” é acessória. A comprovação é inútil. No limite, a História é inútil.

É como se estivéssemos experimentando um novo mundo. Deliciosamente entorpecente e aleatório.

A internet é a mais tentadora das esfinges.

A propaganda e o sufrágio do povo

Pergunta: O que é um trilobita?

(Segundos de espera.)

Resposta: “Trilobites are extinct arthropods that form the class Trilobita, blalablá”.

Para que serve saber, em tempos de acesso universal e democrático à internet? Para que serve armazenar o saber em tempos de Wikipedia?

Ainda que cautelosos ludistas desconfiem das definições democraticamente construídas, antes o saber bocejava na ponta dos pés das bibliotecas. Hoje, fustiga na ponta dos dedos, na ponta da língua.

É que a tese é simples: além de orgânicas, definições são o referendo do infinito coletivo. A mentira não resiste muito tempo ao sufrágio de milhões. A manipulação, tampouco.

A propaganda manipula. E manipulará cada vez menos.

As enciclopédias elaboradas por doutos especialistas falharam irremediavelmente nas suas missões de divulgação do conhecimento e atualização.

A propaganda, criada por sensíveis profissionais, pode falhar dramaticamente na sua missão de sedução e convencimento.

A propaganda de meias verdades ou mentiras superlativas, excessivamente explícita, dramaticamente primária, gritando, cantando e martelando incessantemente com palavras de ordem, crenças laboratoriais e repetição massificada, tem os dias contados.

Essa é a velha propaganda, uma propaganda que insiste em manipular, da forma mais básica, um consumidor cada vez mais arredio, disperso, crítico e com capacidade própria de exponenciar sua opinião.

Se ontem a gente tinha que crer a priori por falta de possibilidade de expressão, hoje a gente desconfia a priori, porque a gente tem o poder de denunciar publicamente e sem intermediários. E isso derruba reputações, como uma bola de neve pequeninha no cume da montanha aniquila uma aldeia no vale.

O prazo de validade da propaganda é proporcional à velocidade de popularização das opiniões. Ou seja, muito curto. Se a mensagem agradar, sua eficiência é retumbante. Se desagradar, seu fracasso é desastroso.

Mas a propaganda tem mais animadores rumos, apesar dos tropeços, das inseguranças e da caretice.

Propaganda deve ser conteúdo, entretenimento, manifestação cultural ou pura informação. Sempre que ela for percebida de uma forma ou de outra, ela será apreciada na medida de sua qualidade, sem o risco do opróbrio.

E sempre que ela raciocina pelo parâmetro do mais tapado, ignorante e passivo dos consumidores, vira piada e vexame.

Colaboration Tabajara

Está tão na moda pedir a opinião ou colaboração dos consumidores em tudo que já não dá para saber se é uma questão de modismo, ou de falta dele. Se é uma questão de tendência ou de falta de novidade. Se é uma preocupação com a opinião dos consumidores ou simplesmente um álibi para justificar um achismo.

Qualquer que seja o motivo, os modismos, tendências, novidades, preocupações e opiniões serão profunda, exaustiva, cacetemente pesquisados. O que significa que tudo irá sair exatamente como alguns punhados de especialistas – a saber os infelizes que raciocinam sob a batuta de roteiros de pesquisas – aprovarem. O que significa também que a gente poderia perfeitamente dispensar os consumidores de suas idéias. Até porque eles não ganham nada com isso. Até porque a gente ganha.

Sempre se pediu a “opinião” ou “colaboração” dos consumidores, de forma indireta, é certo, mas que diferença faz? Que diferença faz pesquisar antes ou antes e depois? Ou antes, depois, depois do depois e depois do depois do depois? E pensando bem: o que tem de novo? Nada a não ser a tardia adesão a uma idéia de alguns revoltosos polêmicos (como esse que vos fala).

A idéia não era bem essa. A idéia não era – nem nunca foi – pedir uma força para o consumidor. Só dizia-se que agora o consumidor é mais ativo, é espectador e emissor, é consumidor e propagador, é público e mídia.

A idéia era dizer que a gente precisa ficar ligado, atento, de orelha em pé porque as pessoas não engolem mais caladas. Que as pessoas reagem rápido e de forma as vezes arrasadoras. Só queria dizer que a gente tem que saber responder, dialogar, revidar até.

A idéia era também que a gente tem que pedir colaboração onde a colaboração faz algum sentido. Onde existe espaço e ferramentas para tal. Me engana que eu não gosto.

A idéia era dizer que tem coisas que tem que ser decididas, corajosamente, top-down. E também que cada um tem que ficar no seu galho. Quem cria cria e quem consome consome. Mesmo que quem cria consome sempre e quem consome agora cria. Democracia tem limites.

No final, o que interessa não é quem criou mas o que se criou. Ou será que o fato de ter sido feito pelo consumidor vai desculpar a porcaria, o lugar comum, a vulgaridade?

Como a gente perde tempo com a opinião alheia!

Quanto mais pobre o país, maior a Internet

A imprensa gosta de alardear, com razão, os sucessos que a Internet tem no país: uma das maiores taxas de crescimento de usuários do mundo, maior tempo médio de conexão, maior comunidade do Orkut, um dos maiores acessos do YouTube, país mais premiado em propaganda interativa, o merecido prêmio que esse Overmundo recebeu recentemente, e por aí vai.

No entanto, os porquês são sempre fantasiosos, poéticos, pouco objetivos: o brasileiro adora novidade, ou o brasileiro é mais criativo – ou o mais gozado de todos –, o brasileiro é um povo surpreendente.

Mas tem uma outra possível explicação. Possível e mais interessante. E mais crível também.

Quem já foi a uma LAN house de periferia, quem já conversou com a sua empregada doméstica, com o filho da sua empregada doméstica, com o amigo mais pobre do filho da sua empregada doméstica talvez tenha um início de resposta.

Que tal pedir emprestado o pen-drive que a garotada carrega no bolso, na mochila ou no pescoço? Dos meninos dos Jardins ou do Jardim Ângela. Tem música, tem trabalho de escola, tem foto de tênis de marca, tem as fotos que ele tirou com o celular para ilustrar sua página pessoal e seus nicknames do MSN, tem até umas experiências de colagem fotográfica, uns vídeos caseiros, umas letras de hip hop.

E quantitativamente, a constatação salta aos olhos: a penetração da Internet nas classes mais pobres tem um crescimento exponencial. Todas as pesquisas dizem isso.

Uma vez, perguntei a um garoto da Cidade de Deus como ele gastava o dinheiro dele. A resposta foi óbvia: “Metade para minha mãe, um quarto para meu acesso à Iinternet em casa (banda larga, claro), mais um pouco para a recarga do meu celular (não dá pra ficar sem) e para minha academia. O restante é para me divertir.” Nada muito diferente de muito garoto bem-nascido, com exceção da ajuda familiar.

E se a gente começasse a perceber que a Internet é um sucesso porque o Brasil é pobre? Porque existem milhões de pessoas que vivem à margem das oportunidades de trabalho, estudo e inserção social. Porque existe uma imensa maioria da população que acha injusta a distribuição de renda do país. Porque toda essa gente quer crescer, quer ganhar dinheiro, quer se informar e se divertir. Porque todos os brasileiros querem se expressar, querem ser ouvidos.

Porque a Internet permite isso tudo e talvez seja a única ferramenta acessível, a única esperança. Bem-aventuradas sejam todas as iniciativas estatais (e privadas) contra a exclusão digital, de investimentos em escolas, de relativização dos direitos autorais, de software livre, de digitalização de trabalhos de domínio público.

Bem-aventurados todos aqueles que acreditarem que esta é a maior oportunidade que o país tem de escapar de um sistema perverso que concentra riqueza e distribui esmolas.

Por que a Internet tem a performance que tem no Brasil? Não seria porque o país é pobre?

A imprensa gosta de alardear, com razão, os sucessos que a Internet tem no país: uma das maiores taxas de crescimento de usuários do mundo, maior tempo médio de conexão, maior comunidade do Orkut, um dos maiores acessos do Youtube, país mais premiado em propaganda interativa, o merecido prêmio que esse Overmundo recebeu recentemente, e por aí vai.

No entanto, os porquês são sempre fantasiosos, poéticos, pouco objetivos: “O brasileiro adora novidade” ou “o brasileiro é mais criativo” ou o mais gozado de todos “o brasileiro é um povo surpreendente”.

Mas tem uma outra possível explicação. Possível e mais interessante. E mais crível também.

Quem já foi a uma lan-house de periferia, quem já conversou com a sua empregada doméstica, com o filho da sua empregada doméstica, com o amigo mais pobre do filho da sua empregada doméstica talvez tenha um início de resposta.

Que tal pedir emprestado o pen-drive que a garotada carrega no bolso, na mochila ou no pescoço? Dos meninos dos Jardins ou do Jardim Ângela. Tem música, tem trabalho de escola, tem foto de tênis de marca, tem as fotos que ele tirou com o celular para ilustrar sua página pessoal e seus nicknames do MSN, tem até umas experiências de colagem fotográfica, uns vídeos caseiros, umas letras de hip hop.

E quantitativamente, a constatação salta aos olhos: a penetração de internet nas classes mais pobres tem um crescimento exponencial. Todas as pesquisas dizem isso.

Uma vez, perguntei a um garoto da Cidade de Deus como ele gastava o dinheiro dele. A resposta foi óbvia: “metade para minha mãe, um quarto para meu acesso a internet em casa (banda larga, claro), mais um pouco para a recarga do meu celular (não dá pra ficar sem) e para minha academia. O restante é para me divertir.” Nada muito diferente de muito garoto bem nascido com exceção da ajuda familiar.

E se a gente começasse a perceber que a Internet é um sucesso porque o Brasil é pobre. Porque existem milhões de pessoas que vivem à margem das oportunidades de trabalho, estudo e inserção social. Porque existe uma imensa maioria da população que acha injusta a distribuição de renda do país. Porque toda essa gente quer crescer, quer ganhar dinheiro, quer se informar e se divertir. Porque todos os brasileiros querem se expressar, querem ser ouvidos.

Porque a Internet permite isso tudo e talvez seja a única ferramenta acessível, a única esperança. Bem-aventuradas sejam todas as iniciativas estatais (e privadas) contra a exclusão digital, de investimentos em escolas, de relativização dos direitos autorais, de software livre, de digitalização de trabalhos de domínio público.

Bem-aventurados todos aqueles que acreditarem que esta é a maior oportunidade que o país tem de escapar de um sistema perverso que concentra riqueza e distribui esmolas.

Porque propaganda na Internet é tão ruim?

A propaganda sempre vai ser propaganda, qualquer que seja o suporte, qualquer que seja a tecnologia, mídia, formato: uma mensagem comercial. E uma boa propaganda sempre vai ser uma boa propaganda, qualquer que seja o produto, a marca, ou o consumidor: uma mensagem comercial com impacto, brand linkage (tentei traduzir mas ficou horrível) e que agrada.

O que mudou, portanto, não é nem o propósito nem a forma de fazer nem a mídia.

O que mudou é que as pessoas estão de saco cheio de serem interrompidos com porcaria. É só isso que mudou.

As pessoas estão de saco cheio de serem obrigados a engolir mensagens idiotas, sejam elas comerciais ou não.

E óbvio, agora, a gente pode escolher. E isso muda tudo, porque a gente escolhe o que nos interessa e despreza o resto.

Nesse cenário, o que muda com a propaganda? Praticamente nada. Só que agora, ficou mais difícil. Muito mais. Simplesmente porque ninguém se deixa mais enganar pelos truques: martelar um jingle, contratar um ator famoso, demonstrar atributos, fazer piadas sem graça, nem mesmo fazer uma linda produção.

Mas o fato das pessoas não gostarem mais de serem interrompidos pelas mensagens comerciais, não significa que a propaganda morreu, só quer dizer que ela tem que ser o que sempre precisou ser mas nem sempre foi: boa.

Outro dia, fui julgar umas “propagandas” inscritas na Internet para um festival. Foi um show de horror, e saibam que faço isso desde tempos imemoriais.

Nunca me encheu tanto o saco ver aquele monte de sites inúteis, piscando pra todo lado.

Nunca fiquei tão irritado com tanto tempo perdido já que, contrariamente ao consumidor normal, eu estava ali para julgar portanto era obrigado a ver tudo.

Nunca fiquei tão nervoso com aquela profusão de vídeos idiotas, sem graça, intermináveis. Nunca fiquei tão desapontado com a qualidade tosca das produções.

Foi uma tortura, mas nada muito diferente de assistir ao Fantástico sendo interrompido pelo lixo publicitário.

Aliás, tem sim aquela diferença: o Fantástico me interrompe com a propaganda e se eu quiser ver o resto da programação sou praticamente obrigado a ser importunado. Já na Internet, to fora! E um dia, o Fantástico também vai deixar de interessar. Nesse dia, a propaganda ruim simplesmente vai morrer. Já vai tarde.

E não adianta nada fazer essas estratégias pseudo-misteriosas, pseudo-spam-virais. Nem encher meu saco com vídeos e interações idiotas. Nem achar que estou morrendo de vontade de interagir com o mundo real no second life.

Porque propaganda ruim, na mídia tradicional funciona. Na Internet não.

O Kem Kem de Hassi Lebied

Kem Kem é o nome do Cyber café/Lan house de Hassi Lebied, uma aldeia aos pés da grande duna de Merzouga no Marrocos.

Hassi Lebied é microscópica. Não está em nenhum mapa. Para chegar lá, pegue a estrada que vai para o sul do Marrocos (só tem uma) e fique atento às placas… Se der sorte, você chega lá. E lá não é muita coisa: meia dúzia de ruas sem asfalto, mal iluminadas, casebres baixos, uma penca de dromedários mascando os dentes e sombras fugidias de mulheres veladas e berbères azuis. Com exceção de poucos turistas que se aventuram de 4X4 ou atraídos pelo exotismo de um “céu que nos protege”, Hassi Lebied é uma miragem na estrada que leva a Merzouga, importante centro turístico no deserto marroquino.

À noite em Hassi Lebied é desolada: a duna ausente, o frio paradoxal, o silêncio opressor e vez por outro o foco azul de um led a iluminar passos acelerados.

Só uma luz colhe os insones vespertinos. É o Café Kem Kem, o maior pólo de entretenimento e de negócios da região.

O Kem Kem é assim, uma espécie de bar de Guerra nas Estrelas em Tatouine (aliás, também desolada aldeia do Marrocos). Os murmúrios no Skype (analfabetos não teclam) e o batuque dos teclados mobiliam a atmosfera. Cutsa barato o Kem Kem: alguns Dirhams a hora ou seja, quase nada. Nada de azaração (país muçulmano oblige) mas muita concentração. Jogam, lêem, conversam, informam-se, assistem seriados e filmes da rica produção marroquina, batem papo com parentes presos na Argélia ou Somália vizinhas, amigos que emigraram, namoradas de um dia, espanholas, francesas, alemãs. Também vendem, compram, encomendam, fecham negócios no Kem Kem, exportam artesanato, contatam grupos de turistas. O dromedário está caro (cerca de dez mil Dirhams) porque quando chove o preço sobe, mas quem sabe em Ouarzazate, contrate-se um bom tropel. No Kem Kem a gente fica sabendo das coisas.

E no Kem Kem também, quando não se tem nada para fazer, porque não se tem nada para fazer sempre em Hassi Lebied, a gente vai lá, e fica vendo o povo, tomando um chá de hortelã, esperando o sono chegar.

O dono do Kem Kem não está rico. Nem pobre. Tem lá seu negócio e vai bem. Os computadores são novos, a conexão boa, e quanto mais pontos colocar, mais gente vai ter para passar o tempo, conversar, comunicar-se, fechar negócios.

O Kem Kem é junto com a mesquita o lugar referência de Hassi Lebied. A mesquita é pra falar com Deus, o Kem Kem é pra falar com os homens.

E existem Kem Kems assim em todo o lugar. Em Marrakesh a oferecida, em Fés a recatada, nas menores e mais longínquas aldeias, no Atlas inacessível, no deserto negro, ao longo da marcha verda na estrada colonizadora do Sahara ocidental. Porque Internet e telefone celular tem para todo canto no Marrocos. Questão de soberania. Questão de coesão nacional. De identidade.

E precisei atravessar meio mundo para entrar no Kem Kem de Hassi Lebied. Mas tem Kem Kem em baixo do meu nariz. Para todo lado, nos mais pobres rincões, das mais às menos organizadas periferias do Brasil.
E aqui o que seria? Questão de inserção social? De acesso ao inacessível? De produção cultural?

Quem tem o que falar, depoimentos (como vários aqui já feitos), mas principalmente pesquisas, estudos sobre o fenômeno das Lan-houses brasileiras? O que é que está acontecendo e como é que a gente tem que enxergar essa terceira ou quarta via da inclusão digital?

Keep It Simple ou Keep it Stupid?

A Internet já provou-se em muitos fronts: ela é eficiente quando é ambiente de transações, quando é comunicação inter-pessoal, quando é informação.

A plataforma que permeia as conquistas do meio é baseada no princípio da “simplificação”. Se a Internet existe para simplificar as transações, a comunicação inter-pessoal e a informação ela não deve, portanto, negar seu propósito. Portanto a Internet deve ser simples.

Opto deliberadamente pelo generiquês e por isso falo em Internet no mais autêntico estilo “me faz uma Internet aí!”. É pura opção simplificadora.

No entanto, quando a Internet é veículo de comunicação ou mídia na assepção do jargão publicitário, a constatação de seu sucesso é mais difícil.

Quando falamos de propaganda, parece que quem usa a Internet para essa finalidade teima em confundir “simple” com “stupid”.

Os motivos são diversos mas o mais evidente de todos é a sintomática tendência de entender o meio como um apêndice purulento das mídias de massa. É constrangedor, portanto, perceber os soluços do meio Internet que balança cronicamente entre tentativas visionárias e contundentes de usar o meio valorizando a interação e as recaídas de passividade estéreis.

Enquanto o meio Internet for usado para imitar de forma tosca e débil os recursos de outros meios, ele será estúpido e portanto dispensável. Pior do que isso, cada vez que o consumidor visita um site desses ele percebe com clareza que a marca valoriza sua passividade, sua ausência de inteligência. Pior ainda, quando o consumidor do meio Internet, acostumado com um tratamento que se esforça pela interação e participação, dá de cara com uma estratégia de marcha a ré sem satisfação, ele reage ou coroa a iniciativa de uma indiferença sem retorno.

Quando será que irão perceber que a comunicação transcende a propaganda muitas vezes esquizofrenicamente dependente das flutuações mercadológicas? Quando vai cair a ficha que as marcas, ao comunicarem-se com seus consumidores, assumem compromissos que transcendem os atributos físicos ou de imagem dos produtos? Compromissos de conteúdo, de entretenimento, por exemplo. E na Internet, mais do que em qualquer outro veículo, de interação.

Sempre que confundem estupidez com simplicidade, lembro-me de um colega que dizia, inocentemente, que a Internet não é boa para veicular filmes.

E isso acontece na publicidade on-line.

Sempre que confundem estupidez com simplicidade, sinto-me pessoalmente ofendido e derrotado pela perniciosa e gananciosa preguiça que contamina um ambiente outrora brilhante e inquieto.

E isso também acontece em alguns sites.

Internet: o maior brechó

O que é novo? O que é original, pioneiro? O que é surpreendente, revolucionário, genial?

Há algo de novo nas pessoas, no mundo e nos sonhos coletivos ou individuais? Por que errar à caça de algo que vença a alienante monodorna cotidiana? Por que o jogo de fingir encontrar? Por que iluminar-se com a descoberta fugaz? E por que seguir peneirando vulgaridades?

Prometeram-me uma revolução, uma rede de expressão democrática e subversiva. Prometeram-nos um universo em expansão, sedutoramente virtual e sem fronteira. Prometeram uma válvula de escape.

A Internet fez promessas e não cumpre. Talvez porque ela não seja esse balaio todo. Porque provavelmente ela é apenas um balaio, sem fundo. A Internet não foi feita para entregar o novo embora ela desfarce a expressão da banalidade com um aparato tecnológico e muitos discursos iluminados.

Mas e o novo?

Talvez o novo não esteja disponível. Talvez ele sequer exista, em estado puro. O novo é sempre um ponto de vista, um ângulo, um filtro. O novo não é novo, está novo. E para isto, precisamos de uma plataforma de velhas coisas, muitas velhas coisas, todas as velhas coisas, infinitas velhas coisas. Essa plataforma, a melhor delas, a mais infinita, se chama Internet.

Mas não basta. Precisamos também perguntar ao velho. A Internet existe para nutrir nossa atávica, incontrolável, reflexiva necessidade de perguntar, perguntar e perguntar de novo. A Internet não está aqui para dar respostas. Pouco importam aliás. É preciso perguntar, sempre perguntar. A Internet só serve para nos dar a ilusão de que existe saída para nossa dramática condição de humanos à procura do novo. Ilusão.

A Internet não é pras massas

Existem as forças da inércia e as forças forçadas. Existem as forças sanitárias e as forças travestidas. Há ainda as forças reptéis e as forças córticas. E no duelo entre as duas, sempre vencem as primeiras, as forças mais fortes que a vontade.

É assim com essa coisa que, por falta de qualificação causal, menos fenomenológica, chamamos de Internet.

E é precisamente porque é da natureza dos humanos ser incapaz de entender as causas, que tratamos da forma a despeito de buscar suas origens. É exatamente porque somos drogados pelas aparências que deslizamos na superfície. Afinal de contas uma onda não faz uma maré. Um raio não ilumina a noite.

A Internet não é grande coisa mesmo. É apenas uma estrutura. Mas o que essa estrutura revela? Seríamos capazes de entender a intenção ou a força por detrás da mesma?

Então achamos que ao povoar a estrutura de objetos e idéias somos capazes de materializa-la. Achamos que ao rechear a rede de sites, justificando torpemente suas existências através dos mais variados argumentos viscerais ou projetivos, estamos entendendo sua força real.

A Internet não é nada se não entendermos quais são os desejos, as fantasias, os sonhos da sociedade e dos humanos. A Internet é somente um laboratório. Mas podemos aprender com ele sem hipóteses, dogmas ou ideologias?

Pois para mim a Internet não é nada se não entendermos que as pessoas estão aprisionadas sem conforto numa estrutura que as tolhe, numa ordem que as oprime. A Internet não é nada se não enxergarmos que as sociedades estão em colapso, na beira do abismo. A Internet não é nada se não sacarmos que não há mais razões para os agrupamentos, não há mais vontade de massificar-se. A Internet é uma idéia malograda se não admitirmos que o velho está moribundo.

Mas é justamente porque, percebemos, consciente ou inconscientemente, o desmoronamento da sociedade de consumo massificada, pasteurizada, supérflua e idiotizante que a Internet é nossa única bandeira.

Se sentirmos isso, lá dentro de nós, iremos reconstruir o mundo. Caso contrário, iremos reproduzir, ad mortem, fórmulas e modelos caducos.

Quais são os reais sucessos da Internet? Os de verdade, ou seja, não aqueles que dão dinheiro fácil ou difícil, não aqueles que fazem barulho ou criam polêmica, muito menos aqueles gigantescos cemitérios de bits que sobrevivem a custo de malabarismos aritméticos. Estou falando daquelas idéias que fazem as pessoas usarem sem estímulo externo, sem artifícios de posicionamentos bem nascidos, sem promoções, sem promessas falsas ou reais.

O E-mail? O chat? O Blog? A video-conferencia? O Instant Messenger? As páginas pessoais? O marketing incidental? Os spams (sim, claro, os Spams são um sucesso)? Que mais? Sei lá. Não achei nenhum outro verdadeiro sucesso.

A Internet não é uma mídia de massa e tampouco é uma mídia um-para-um. A Internet não é o correio e muito menos o telefone. A Internet não é um shopping center, nem um jornal, nem uma TV, nem um parque de diversões. Se for só isso, não precisamos dela.

A Internet é tão somente uma plataforma de expressão dos humanos. Qualquer iniciativa que pretender, de forma artificial, limita-lo, enquadrá-lo, agrupa-lo e principalmente calá-lo é pequena e efêmera.

Algumas considerações sobre a proibição da propaganda de cigarro na Internet.

A Lei nº 10.167, de 27 de dezembro de 2000, alterou diversos artigos de uma lei anterior (Lei nº 9294/96) que dispunha sobre restrições ao uso e à propaganda de produtos fumígenos (todos os que produzem fumo, fumaça).

Entre as alterações trazidas pela Lei nº 10.167, está a proibição da propaganda por meio eletrônico, aí incluída a internet. A Resolução – RDC nº 15, publicada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA em de 17 de janeiro de 2003, apenas veio regulamentar a lei promulgada em 2000.

A resolução tem por fim, dispor em detalhes, e.g., explicitando conceitos, definindo procedimentos, as linhas porventura sinteticamente traçadas no texto legal. Ao operar, por exemplo, a definição de propaganda, a resolução tão-somente estabelece o conceito que deverá guiar a administração pública, de modo a evitar interpretações díspares por parte desta, quando da aplicação da lei. Na lição do jurista Celso Antônio Bandeira de Mello, “a precisão aportada pela norma regulamentar não se propõe a agregar nada além do que já era comportado pela lei, mas simplesmente inserir caracteres de exatidão ao que se achava difuso na embalagem legal”.

A portaria, portanto, não inova (nem poderia inovar). Vem apenas detalhar os limites que a Lei nº 10.167 já impusera, de modo a dirimir possíveis dúvidas que fatalmente surgiriam no momento da aplicação da lei.

É no corpo da Resolução nº 15 onde se encontram alguns esclarecimentos às dúvidas apresentadas. Lá, por exemplo, define-se o que constitui propaganda para a lei.
De acordo com o inciso 1º do Art. 1º da Resolução nº 15/2003, considera-se propaganda de produtos derivados do tabaco qualquer forma de divulgação, seja por meio eletrônico, inclusive internet, por meio impresso, ou por qualquer outra forma de comunicação ao público, consumidor ou não dos produtos, que promova, propague ou dissemine o produto derivado do tabaco, direta ou indiretamente, realizada pela empresa responsável pelo produto ou por outra por ela contratada.
O Parágrafo único desse artigo vai além, considerando abrangidas na
definição acima a divulgação de catálogos ou mostruários de produtos
derivados do tabaco, tanto na forma impressa como por meio eletrônico; a divulgação do nome de marca e elementos de marca de produto derivado do tabaco ou da empresa fabricante em produtos diferentes dos derivados do tabaco; a associação do nome de marca e elementos de marca do produto ou da empresa fabricante a nomes de marcas de produtos diferentes dos derivados do tabaco, a nomes de outras empresas ou de estabelecimentos comerciais; bem como qualquer outra forma de comunicação ou ação que promova os
produtos derivados do tabaco, atraindo a atenção e o interesse da população, seja ela consumidora ou não dos produtos, e possa estimular o consumo ou a iniciação do uso.

Se antes do advento da Resolução nº 15, a Lei poderia suscitar dúvidas acerca do que constituiria propaganda para os fins nela citados, temos que, com a publicação da Portaria nº 15, essas dúvidas foram virtualmente extintas, dada a amplitude do conceito ali expresso.
Traduzindo: Nada pode ser feito. A propaganda de cigarro, de qualquer natureza, em qualquer meio, com ou sem disfarce, que já estava proibida desde 2000, está mais claramente ainda banida do Brasil.
Traduzindo ainda: Esqueçam e conformem-se.
Traduzindo mais: Nem na Internet. Nem pagando. Nem vendendo. Nem nada.
Propaganda de cigarro é quase crime. Esconda seu maço de cigarro, senão você pode acabar preso.
Não há, portanto, muito o que comentar sobre a lei. Ela é cristalina e não há brecha.
No entanto, apesar de ser uma lei, isso não significa que tenhamos que achá-la necessariamente justa.
Pois vejamos.
A propaganda, por definição, é uma ferramenta que auxilia na venda de produtos e serviços que, por definição também, são legais. Propaganda ajuda a vender produtos e serviços cuja venda é legal.
Proibir a propaganda de algo que não é proibido é o primeiro contra-senso. Se é ilegal fazer propaganda de algo que é legal vender, há algo de errado. Ou no entendimento do que é propaganda, ou no entendimento do que é legal.
Mas esse assunto, que abre o perigoso precedente de começar a proibir, proibir, proibir, controlar, controlar, controlar, não está em pauta mais, infelizmente.
O que está na pauta é a proibição de propaganda “na Internet”.
Ainda que não possamos ter dúvidas sobre a abrangência da lei, podemos levantar algumas questões.
•    Existe propaganda na Internet. Mas a Internet não serve apenas para isso. A legislação parece confundir-se um pouco, portanto. Mas não há dúvidas, no entanto, de que a lei proíbe tanto a propaganda na Internet quanto qualquer utilização do meio para falar de cigarro. A não ser para dizer, é claro, que o cigarro é “um produto que oferece risco à saúde pública” (sic). Pode vender nos milhões de pontos de venda do país mas pela Internet “oh, perigo, perigo, perigo!”

•    A rede mundial de computadores é mundial. Isto é, de acesso mundial, sem restrições e sem controle tecnicamente viável de seu conteúdo. Portanto, um brasileiro pode acessar um site de uma marca internacional de cigarro localizada em Moçambique, Angola ou Goa – em português – com a mesma facilidade com que acessaria o site da mesma marca produzido no Brasil.
•    Ou ainda, o que aconteceria se o site ou mesmo o banner de publicidade estivesse hospedado em algum país suspeito ou que permitisse a publicidade de cigarro? Como enquadrar esse caso? Pode ou não pode? A menos que a próxima revisão da lei seja de proibir o acesso de sites “ilegais” no país. Só faltava essa.
•    Mais uma vez, a Internet coloca para o legislador um impasse. Um impasse tecnológico, claro, mas principalmente um impasse que não se resolve com determinações legais. Por que não confiar na boa vontade dos fabricantes, uma vez na vida, impondo-lhe restrições de comunicação e outras imposições legais ao invés de tirar-lhes pura e simplesmente o direito de falar dos produtos que produzem? Não é mais inteligente uma acordo de boa fé com empresas sérias, que empregam e pagam impostos do que impor regras em uma mídia que por definição se lixa das regras?
•    Ainda, sobre a justa preocupação com o acesso de menores de idade ao fumo, o que tem a propaganda a ver com isso? Mais. O acesso a um site de uma marca de cigarro na Internet pode muito mais facilmente ser controlado do que a venda de cigarro em qualquer padaria do Brasil a uma criança de 4 anos de idade. E de forma simples, inteligente e eficiente.
•    Visitar um site da Internet é um ato deliberado, consciente, racional. Não se visita um site na Internet por impulso inconsciente. Ainda que possamos dizer que a propaganda tem uma ação sobre o inconsciente das pessoas, argumento bastante duvidoso, ainda assim, digitar www.marcadeumcigarro.com.br é uma ação racional e não subliminar, impulsiva.
•    Proibir sites de marcas de cigarro é um atentado à liberdade consciente do cidadão. Um atentado à liberdade de expressão, uma restrição à livre iniciativa. Um atentado à liberdade do cidadão de deliberar conscientemente sobre suas ações e eventualmente responder legalmente por elas.

Sexo virtual.

Outro dia, a Veja publicou uma vasta matéria sobre relacionamentos virtuais. Era de se esperar que além de ser um assunto velho a análise fosse superficial, apesar das pesquisas idiotas que sempre ilustram esse tipo de conteúdo.

No entanto, no momento em que uma revista como essa dá o destaque que deu a esse assunto, o mínimo que se pode inferir é que quem estava de fora disso está completamente por fora do resto também. Em outras palavras e me perdoem o radicalismo, mas quem nunca tinha ouvido falar disso está em coma, quem se surpreende, no manicônio e finalmente quem faz cara de nojo, deve ser extraterestre. A turma do eu-hein-deus-me-livre precisa se tratar.

Muito já se falou a respeito do que rola nesse tipo de relacionamento e para resumir a minha opinião eu diria que é quase sempre muito melhor, mais franco, mais honesto, mais verdadeiro e profundo começar um relacionamento pela Internet. É também mais sadio, mais aberto, democrático e sem preconceito. Em suma, é tudo de bom.

Mas eu queria ir além e me perdoem a falta absoluta de censura e moralismo. A experiência do chamado sexo virtual também é interessante.

Tem gente que vai dizer que não é sexo, é masturbação. Sei lá. Acho que masturbação é sexo também. Beijo de língua também. Certas carícias também. Para continuar no estilo nu e cru, onde há emissão e/ou troca de líquidos, há sexo.

Pois bem, quem nunca ficou excitado com certos estímulos visuais? Há algo de errado nisso? Certamente não. É condenável? Tampouco. Agora imaginem a mesma coisa só que tendo do outro lado uma interação, visual, escrita, falada? Não parece uma evolução? Não parece mais gostoso? Vamos ser cem por cento analíticos: parece sim.

Se concordamos, vamos em frente no raciocínio.

É evidente que sexo com contato físico é infinitamente melhor. No entanto, se estamos de acordo que entre a excitação através de estímulo visual sem interação e o sexo físico existe uma etapa como descrita acima, podemos introduzir dois argumentos que a tornam iresistível, salvo para os puritanos e platonicos de plantão.

Em primeiro lugar é mil por cento seguro tanto no que diz respeito aos riscos afetivos quanto aos riscos físicos.

Em segundo lugar e mais importante, nem sempre é possível, por questões diversas, praticar sexo físico mas podemos afirmar com pouca probabilidade de erro que a vontade de exercitar as zonas erógenas é sempre maior do que a possibilidade de fazê-lo a dois (ou mais de dois). Portanto fazê-lo usando a etapa do sexo virtual parece ser a receita mais indicada e prazeirosa, ao menos até inventarem outra coisa ainda melhor.

Acho que chegamos ao final do singelo raciocínio: relacionamentos virtuais são bons e sexo idem.

Pratiquem sem medo.

Banner de 12Ks, maldito seja.

Este troço que você está vendo logo acima desta coluna se chama banner. Foi inventado por um nerd carrancudo que foi obrigado a ceder espaço comercial no site que ele havia produzido. Como ele não era do métier e detestava a perspectiva de ver a Web virar um espaço de exploração capitalista, ele definiu que esse espaço tinha que ser assim, ridiculamente pequeno, absurdamente leve e com um padrão tecnológico de mínimo denominador comum, portanto ultrapassado.  Foi assim que ele nasceu, muitos anos atrás, este que é considerado, hoje em dia, o formato padrão de publicidade da Internet comercial: um banner de 12 Ks e 468 X 60 pixels. 12 Ks, para se ter uma idéia é menos do que um arquivo Word vazio, sem nenhum texto. Já 468 X 60 pixels é igual a 16, 51 X 2,12 centímetros.

O Brasil é realmente um país estranho. Há algum tempo atrás, o país aparecia nas estatísticas como um dos que tinha maior crescimento de usuários de Internet no mundo. Ainda, encontrávamos aqui alguns dos maiores e mais visitados portais do mundo. Nos festivais internacionais de publicidade, eramos aclamados como os mais criativos. E de repente, pirlimpimpim, sofremos mais uma vez do nosso endêmico complexo sub-desenvolvimentisa.

É verdade que continuamos com um crescimento importante de pessoas plugadas. Ainda temos portais pesos-pesados e iniciativas animadoras. No entanto, pasmem, esse troço aí de cima, o tal do banner continua igualzinho ao que ele era 5 anos atrás. O formato é o mesmo, o peso idem. Isso é particularmente surpreendente se levarmos em consideração que as conexões estão cada vez mais velozes, os computadores idem.

Só quem tenta, na prática, autorizar mídia na Internet sabe do calvário e do mau humor dos portais em aceitar formatos e pesos fora do padrão. Pior, só quem tenta criar idéias interessantes para anunciar as marcas dos clientes da melhor maneira possível, sabe do suplício que consiste em se adequar ao banner de 12 Ks.

Querem coisa pior ainda? Então basta navegar por aí, em sites americanos e europeus para ver o tamanho do nosso atraso. Banners grandes, impactantes, com as tecnologias adequadas. Ainda são banners mas que diferença quando comparados aos nossos raquíticos 12 Ks!

Claro que existem exceções. Mas será que exceções resolvem alguma coisa? Há quanto tempo ouvimos os portais dizendo “queremos idéias inovadoras, somos flexíveis, etc e tal”. Mas na hora de autorizar, o stress começa. A hora não está para exceções mas para uma ação simultânea e colegiada dos maiores portais para varrer definitivamente o maldito preconceito que consiste em achar  que o usuário de Internet não gosta e não quer propaganda.

Banner de 12 Ks, maldito seja.

A sinuca da publicidade on-line.

Na semana passada, fomos surpreendidos por um desfalque de conteúdo on-line: o GuiaSP e o GuiaRJ sumiram da noite para o dia. Ainda que tenhamos sido brindados ultimamente com amargos dissabores do mesmo tipo, com o  desaparecimento de importantes e úteis iniciativas ou com a queda de qualidade sistemática de outras, dessa vez espumei mais que de costume.

Não cabe aqui discutir as razões que levaram grandes e importantes sites a fechar as portas. Além de serem óbvias, prefiro deixar tais comentários aos analistas, consultores e outros profetas que muito sabem vomitar explicações pós-facto e arrogar-se de teses apocalípticas ou milagrosas.

No entanto, por mais que as motivações financeiras sejam implacáveis, é difícil conformar-se que, de repente, não mais poderemos contar com esses que eram os melhores e mais competentes sites de serviços sobre São Paulo e o Rio de Janeiro.

O triste dessa história é a pavorosa sensação de que estamos retrocendendo, perdendo direitos adquiridos. A Internet comercial está em crise de negativismo.

Há de existir uma ou várias soluções para essa sinuca. É hora, mais do que hora, de discutir a mais evidentes das questões: por que os veículos comerciais, todos eles sem exceção, não conseguem atrair anunciantes?

Falam de má vontade das agências, de desconhecimento do anunciante, de comportamentos predatórios dos veículos.  Falam de modelos de comercialização complexos ou pouco convicentes, de formatos de publicidade inadequados e enferrujados, de obstáculos culturais no marketing das empresas.

Todas essas razões existem em maior ou menor grau. Pior fica a análise, no entanto, quando, na ponta do lápis, faz-se a conta da eficiência da publicidade on-line do lado do consumidor/usuário. Não existe nada mais simples do que provar racionalmente que publicidade on-line tem alto impacto, capacidade de consolidar imagem e gerar receita para o anunciante. Todos os veículos e agências já fizeram essa conta e, pasmem, a conta fecha.

Então, o que há de errado?

Errada é a falta de corporativismo, falta de discussão, de debates, de planos de ação. A hora não está mais para soluções individuais mas institucionais. Acredito que o mercado está suficientemente maduro e calejado para superar os preconceitos e rixas. Ainda, o que interessa agora, mais do que contas e equações, é o engajamento dos agentes. Pessoas envolvidas emocionalmente surtem mais e mais duradores efeitos do que fórmulas racionais.

Não é a primeira vez nem será a última que veremos soluções colegiadas tomarem corpo e surtirem resultados de curto prazo.

Na pauta urgente, reunir os agentes e envolvê-los num acordo institucional de revitalização do meio. Pelo bem do mercado.

Na pauta urgentísssima, colocar os GuiasSP e o GuiaRJ no ar. Pelo bem do usuário/consumidor.

Internet mata.

Fui ao médico fazer um check-up. Coisas de quase velho. Exames mil, aquela chatice. O resultado era endereçado ao médico, mas, óbvio, abri antes da consulta. Li no carro, às pressas. Sem entender patavina, a primeira linha era terrível e vaticinava: um câncer horroroso no fígado. O trânsito estava terrível, e meu testamento já estava pronto quando cheguei em casa. Meu piano, meu cachorro, meus livros, já estava tudo etiquetado. Será que seis meses é o suficiente para conhecer a Índia e a China? Será que nesse caso dá pra sacar o fundo de garantia? Choro com todos ou fico na minha e sofro um adeus romântico?

Mas eu precisava saber de tudo. Talvez ainda tivesse um ano de vida. Um ano para aprender uma partita de Bach? Acho que dá. Um ano, comendo chocolate sem parar: azar, o caixão vai ficar pesado. Preciso comprar um notebook com bateria atômica: vou escrever um romance de mil páginas no Uzbequistão.

Como um raio, fui até o computador, catando um pote de geléia no caminho. Aquela supercalórica que ganhei anos atrás. Se tiver estragada, paciência: “Morreu de tanto comer geléia”.

Estava lá: uma universidade na Espanha havia feito uma pesquisa séria, tinha que ser séria, claro: em 34% dos casos era batata, o cara morria. Mas o hospital militar de Indiana era mais categórico: não adianta operar, é morte lenta e sofrida. A noite foi excitante. Fui a um chat americano e joguei a pergunta: “Alguém aí sabe o que é o que tenho?” Um cara respondeu que a mãe tinha isso. Perguntei mais, detalhes, choramos juntos, acabamos bons amigos, prometi meus CDs de Bach pra ele. A noite foi longa. Comecei a escrever um e-mail coletivo. Até que ficou bacana. Gozado até. Vai circular pela Internet como um SPAM abençoado. Uma corrente de fé na vida. Preciso escrever a todos que amei. Como Napoleão, “Quero morrer no meio de todos que amei e que amo tanto”. Bonito. Vão chorar pacas.

Amanheceu. Não fui à academia, nem fiz a barba. O dia transcorreu penoso. O fígado, quem diria, logo eu que não bebo!

Consulta às 15 h: cheguei às 14 h, sorridente, conformado, com aquela luz dos predestinados.

– Então, tá tudo legal aqui.
– Tudo legal, (O cara é otimista, saco!)
– Coração de atleta, hein?
– Atleta! (Quem sabe um trekking no Nepal, boa.)
– Você não abusa da alimentação, aparentemente.
– Não, claro que não (A geléia, ainda sobrou geléia de amora?)
– Muito bom. Volte aqui em seis meses.
– Muito bom? Está muito bom? (OK, eu sabia que tinha um ano, e daí?)
– É, seus exames estão ótimos.
– Mas, doutor, e o fígado (Será que ele não viu? Que cara frio!)
– O fígado, o que tem o fígado?
– É…esse troço aí, na primeira linha?
– Ah, isso, é normal.
– Normal? Mas e a pesquisa da universidade de Valência? E a do Hospital Militar de Indiana? Eu sou forte, doutor, pode falar.
– ???
– Estou pronto. Operamos ou não?
– ???
– O Senhor acho que eu tenho seis meses ou um ano?
– ???
– Será que não seria interessante uma outra opinião?
– ???
– Eu pesquisei, doutor…
– Pesquisou, é?
– Sim, sim, eu não resisti, fui indiscreto, abri o exame.
– Na Internet?
– É, claro, a universidade de Valência, o Hospital Militar de Indiana…

O doutor caiu numa gargalhada retumbante, me serviu café, me deixou fumar, me deu um chocolate e marcou a próxima consulta. Eu, mudo, escandalosamente envergonhado, absurdamente desapontado e terrivelmente vivo.